O veto de Bolsonaro à publicidade institucional do Banco do Brasil destinada ao público jovem custou mais do que a cabeça do diretor de comunicação e marketing Delano Valentim: custou o emprego temporário de dezenas de jovens em São Paulo, Rio, Brasília, Goiânia, Florianópolis e Recife envolvidos na campanha de abordagem de possíveis novos clientes nas imediações de agências escolhidas para a ação. O objetivo era apresentar produtos e serviços ao público-alvo que passa habitualmente em frente, mas não tem conta. Foram contratados jovens para conversar com jovens caretas, descolados, cabeludos, negros, brancos, tatuados, gays, enfim uma gama variada gente que vemos nas ruas do Brasil contemporâneo.
Mas como o Brasil deixou de ser contemporâneo de grande parte de seus habitantes, a voz das trevas mais uma vez falou mais alto e impôs silêncio a uma ofensiva mercadológica que com certeza teria êxito, pela identificação do banco com o público que acompanha esportes e manifestações culturais em todo o país – gente nova e cheia de ideias e sonhos. O projeto seguiu pesquisas prévias e indicadores sociais e econômicos que lhe deram base científica, posto que nada é feito de orelhada numa instituição do porte do Banco do Brasil. Mas o pesadelo brasileiro se traduziu com clareza cristalina, no café da manhã de quinta-feira com jornalistas, quando Bolsonaro disse que o Brasil não é destino próprio para gays (“aqui temos famílias”) e se algum turista quiser vir transar com mulher será bem vindo. Só faltou dizer que ele mesmo teve um apartamento funcional da Câmara dos Deputados “pra comer gente”, que mal há nisso?
A intromissão de Bolsonaro num assunto que sequer remotamente diz respeito à presidência da república foi a quarta desde que tomou posse, há escassos quatro meses, o que dá uma média mensal de uma intervenção. Ainda em janeiro, o ministério da Saúde foi forçado a suspender a distribuição de uma cartilha destinada a mulheres trans que estava em circulação havia seis meses. Em seguida, no Carnaval, o material difundido contra a Aids eliminou toda e qualquer referência gay, mostrando apenas casais héteros, como prefere Bolsonaro. No mesmo mês de março, a cartilha distribuída a crianças e adolescentes continha informações sobre calendário vacinal, saúde e sexualidade. A crítica era de que “não pegava bem” crianças de oito e nove anos terem acesso ao material. Claro! Num país onde “menino veste azul e menina veste rosa” todo atraso se justifica, não é mesmo?
As intromissões do capitão em assuntos alheios às suas atribuições lembram Jânio Quadros proibindo biquínis e governando por bilhetinhos, o tuíter da sua época. A estupidez não apenas avançará mas até será intensificada. Nas escolas do ensino fundamental onde o ensino está militarizado, meninos cortam o cabelo e meninas arrumam os seus à moda dos quartéis. Nos gabinetes federais de alto escalão funcionárias usam batom neutro, saias na altura dos joelhos, terninhos em tom sóbrio e nem se pode falar em decote e tatuagem. E não se iludam: muita gente está aplaudindo com entusiasmo cívico esta escalada da falsa moralidade fascista. Enquanto isso, cresce o número de boçais acreditando que a terra é plana e não gira em torno do sol, que não existe gravidade e que o sítio de Atibaia pertence mesmo ao Lula.