Projeto “Arte Suave de Lutar” une o esporte e o social ao trabalhar o Jiu-Jitsu junto a crianças e adolescentes em risco social. O propósito do projeto é levar aos jovens a prática do esporte, não apenas como luta, mas agregar valores para a vida como amizade, autocontrole, perseverança e, principalmente, afastá-los das diversas violências que proliferam e submetem a juventude no Conjunto de Favelas do Alemão.
Idealizado por Vanderlei Vidal, o Mestre King, juntamente com outros colaboradores, o projeto “Arte Suave de Lutar” tem no Jiu-Jitsu, a ferramenta de luta e enfrentamento contra as diversas carências sociais que submetem a juventude a sua própria sorte, em meio aos conflitos, violências e descasos, nos territórios deixados de lado pelo poder público. Com estrutura baseada na colaboração, a iniciativa se mantém pela força e a vontade da comunidade, que tem na orientação de meninas e meninos, a esperança para o futuro.
Com estrutura pequena, mas grandeza no espírito, desde 2002, Mestre King, juntamente com colaboradoras e colaboradores, que tocam com garra e perseverança o projeto, vêm orientando e formando lutadores no tatame e para a vida. Nos campeonatos, mesmo com dificuldades, pois não há apoio governamental ou iniciativa privada, meninas e meninos do projeto saem vitoriosos. Hoje, os filhos dos primeiros participantes da iniciativa e também apoiadores, fazem parte desta história.
Uma história de luta e resistência de agentes sociais preocupados com a orientação da juventude, residentes na Comunidade das Casinhas em Inhaúma, para fora das violências, visando a formação cidadã, a partir do esporte na prática do Jiu-Jitsu, como luta e filosofia de vida. É a “Arte Suave de Lutar”, a essência da iniciativa social.
O projeto atende a cerca de 60 jovens e, também, adultos, na prática do Jiu-Jitsu, que se reúnem para os treinos nas segundas, quartas e sextas-feiras, nos finais de tarde, no espaço Casarão da Cultura. Um centro de cultura e lazer, situado na estrada Adhemar Bebiano 3006, em Inhaúma na Comunidade das Casinhas, que faz parte do Conjunto de Favelas do Alemão.
Vanderlei Vidal, o Mestre King, em entrevista concedia à ANF, na ocasião da festa de encerramento de 2017 e pausa nas atividades, esclareceu alguns pontos da iniciativa, suas dificuldades e perspectivas, nos apresentando a dimensão do trabalho realizado, assim como, o potencial social e esportivo do projeto.
ANF: O que é e quais os objetivo do Projeto?
Mestre King:
Arte Suave de Lutar contém a essência dos seus objetivos. O projeto é uma ideia individual, mas com o pensamento no coletivo e no social. O projeto não é meu, não aconteceu sozinho, é da comunidade, aberto as filhas e filhos das moradoras e moradores que quiserem participar.
O projeto já existe no Alemão desde 2002. Nele, todas as crianças praticam esporte de graça. O intuito é tirar as crianças da rua para trazer para o social, ocupando a mente delas no esporte, pois esta prática ajuda as crianças e os adolescentes tanto no estudo quanto na vida social.
Quando montei esse projeto nunca tive o objetivo nem ambição em ganhar dinheiro ou promoção pessoal, mas sim, de trazer as crianças e adolescentes para o projeto. O que fazemos aqui não tem o objetivo de ser um meio para ganhar a vida, mas uma filosofia de vida que busca atuar na realidade para transformar o meio. Isso com trabalho voltado ao social, no presente, com o olhar no futuro. Afinal, as crianças e adolescentes de hoje são o futuro de amanhã, a partir das oportunidades que proporcionarmos a elas a partir do hoje.
Jiu-Jitsu é uma prática esportiva do qual todo o Brasil sabe e conhece o potencial para a formação cidadã e responsabilidade social. É uma modalidade esportiva que leva aos jovens a consciência de que só podemos vencer unidos numa causa comum, com disciplina e perseverança. Meu objetivo maior foi esse aí, voltado para o social e o cuidado com a juventude. Então, estou até hoje com o projeto juntamente com as duas pessoas, a Carla e a Patrícia, que ajudam a tocar a ideia para frente.
Nos anos que se passaram as crianças tornaram-se adultas. Temos pessoas que desde criança participavam do projeto e, hoje, são mães e pais com seus filhos aqui treinando no Jiu-Jitsu junto conosco. Então, é uma grande satisfação, pois quando vejo isso aqui eu me emociono sempre.
Só em falar do Jiu-Jitsu eu me emociono, porque é muito gratificante você ver o sorriso de uma criança. Quando ela ganha um quimono, quando ganha uma faixa, quando ganha um abraço ou quando está numa festa.
Neste ano (2017) fomos vitoriosos. Ganhamos um campeonato por categoria, tiramos em quarto lugar, sendo projeto social. Foi na disputa do campeonato da Liga Olariense, que tem todo o ano, quatro etapas, e conseguimos tirar o quarto lugar por equipe, onde tinha dezoito equipes. E sendo projeto social ninguém acreditava. E por categoria, oito crianças nossas ganharam troféu individual por categoria. Então, eu fiquei muito gratificado por isso aí. Fiquei alegre, sorri, chorei, pulei, porque é difícil você levar para participar de um campeonato, crianças desacreditadas, por ser um projeto social, e chegarem lá e serem campeãs. É muito emocionante e gratificante.
ANF: O projeto recebe apoio ou ajuda de fora, digo, do poder público, da iniciativa privada, Organização Social, empresas ou comerciantes locais?
Mestre King:
Não, a gente não recebe ajuda de ninguém. Comigo há duas pessoas que estão diretamente na coordenação do projeto. A Carla e Patrícia, duas “secretárias sem dinheiro”, donas de casa e mães, comprometidas, com vontade de ajudar e fazer o projeto acontecer e crescer.
Fora a ajuda dessas duas guerreiras, pedimos ajuda a alguns moradores e pais que podem. Como no caso para o evento que está acontecendo hoje. Pedimos ajuda na compra dos refrigerantes, para o gelo pedimos ajuda ao Rei do Gelo, o pula-pula que a gente pediu para uma moradora que trabalha com festas, conforme concedeu para nós os dois brinquedos que aqui estão. As outras coisas conversando com um, conversando com outro, vamos pedindo ajuda daqui e dali e, no final, montamos a festa. Mas no decorrer do ano a ajuda é nossa mesmo, nós vamos com a cara e a coragem. O que mantém a ideia é o coletivo, a comunidade reunida para o bem de nossas crianças e adolescentes.
A gente chama as mães que abraçam a causa também, os responsáveis das crianças que podem nos ajudar. Em eventos durante o ano e quando for montar uma festa como está, para não ficarem pesadas a ninguém, as mães ajudam na montagem e ornamentação até o próprio espaço para botar flores e sempre ficar bonito, para as crianças se divertirem a vontade, sem perigo nenhum e se sentirem bem. Pois as crianças têm que ter refrigerantes, água, algo para se alimentar, senão não se consegue mantê-las concentradas.
O projeto busca mostrar possibilidades internas à comunidade em autogestão, o coletivo atuando como agente social e político, ao mesmo tempo dando possibilidades aos cidadãos em formação para trabalhar a cidadania pelo esporte. É isso que o projeto está fazendo.
O esporte está trabalhando a cabeça de muitas crianças aqui no Jui-Jitsu, eu tenho criança com síndrome de Down, que hoje é lutador e campeão Estadual. Tem outra com dislexia e, hoje, está ai pulando e brincando no pula-pula, passou de ano no colégio, com todas as notas boas, e é campeão Estadual também. Então a minha alegria é enorme. Com o esporte temos a inclusão no sentido mais amplo.
ANF: Quantas crianças são atendidas no projeto?
Mestre King:
Temos 60 crianças no projeto. Dos 5 até 15 anos está no projeto de crianças, passou daí colocamos no projeto de adultos. Misturo juvenil com as crianças e os adolescentes com os adultos.
Trabalhamos com os jovens até se tornarem adultos e até quando quiserem. Até quando aguentarem. Se tiver 100 anos e quiser vir estamos com as portas abertas. Não é algo que deixamos a juventude de lado, chega à idade adulta e deixamos para lá. Tem pai e mãe treinando aqui com a gente. Tem um casal treinando junto com a filha. Aqui acolhemos a todas e todos que estiverem interessados na prática do Jiu-Jitsu.
O projeto está voltado a ajudar as crianças e adolescentes da comunidade com a prática do esporte. Agradeço a oportunidade que vocês da ANF estão dando, vindo aqui e conhecendo um pouco nosso projeto e possibilitando visibilidade, pois o nosso projeto é voltado para a comunidade, sem divulgação para fora, pensado simplesmente para ajudar dentro da comunidade. Mas se tiver alguém com possibilidade, com condições e querer nos ajudar, então venha e conheça o projeto, adotem/abracem uma criança, doem quimonos, ajudem quando formos participar em competições, alimentação entre outras que possam ajudar em nossas atividades e na manutenção do projeto. Toda parceria e ajuda é bem vinda.
ANF: Como as pessoas podem entrar em contato para fazer parceria e ajudar o projeto?
Mestre King:
Aos interessados em nos ajudar temos no facebook “Arte Suave de Lutar”, todas as informações do projeto. Ali as pessoas podem entrar em contato conosco. Também podem entrar em contato comigo no facebook, Vanderlei Vidal, mestre King, e pelo telefone/whatsapp: (021) 98115-0519.
Quem quiser nos visitar e ver nosso projeto, estamos no antigo Asilo, que fica na entrada da comunidade das “Casinhas”, na estrada Adhemar Bebiano 3006, em Inhaúma, ao lado da fábrica da PlusVita. É só seguir em frente que chega ao Casarão da Cultura.
Referências:
https://rioquemoranomar.blogspot.com.br/2016/04/engenho-da-rainha-que-rainha-deu-nome.html
https://rioquemoranomar.blogspot.com.br/2010/11/complexo-do-alemao-o-inicio-de-uma.html
http://wikimapia.org/27686216/pt/Antiga-Fazenda-das-Palmeiras-Atual-Centro-Cultural-do-Casar%C3%A3o
http://www.amcnsp.org/
http://postozero.com/arte-e-cultura/centros-culturais/casarao-da-cultura