“Na delegacia, o ocorrido não foi registrado como atentado à minha vida, mas como danos materiais ao meu carro. Quando tentava dar o depoimento, hoje, me coagiram para eu falar o nome do suspeito, mas não poderia porque não tive acesso às câmeras. Fiquei muito nervosa”.
A jornalista Alana Rocha, teve seu carro apedrejado em Riachão do Jacuípe -Bahia, onde mora e trabalha. Ela tentou registrar boletim de ocorrência, mas o delegado da Polícia Civil responsável pelas investigações está de férias.
O episódio aconteceu no dia 13/04 e na última segunda-feira, (17), Alana retornou a delegacia, mas não conseguiu fazer seu depoimento. “Ficam com essa enrolação, acho que estou cercada de inimigos”, comenta Alana, à direção do Sindicato dos Jornalistas da Bahia (Sinjorba).
A jornalista está recebendo suporte da Comissão da Mulher da entidade e da Rede de Combate à Violência contra Profissionais de Imprensa, lançada no dia 4 deste mês, em iniciativa conjunta do Sinjorba e da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).
O fórum é composto por órgãos públicos, pela OAB-BA e por veículos de comunicação.
Alana comenta que a não liberação das imagens das câmeras da rádio Gazeta FM, que podem identificar o autor do apedrejamento, é hoje um problema para o caso.
Nesta terça (18), Sinjorba e ABI-Bahia vão acionar novamente a Secretaria de Segurança Pública (SSP) e a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SJDH), órgãos que compõem a Rede, para relatar o andamento da situação e reiterar o pedido de providências que garantam celeridade nas investigações e segurança à profissional.
Carta aberta
“A minha mãe está abalada e fragilizada, não se alimenta direito, não está dormindo bem, temendo que eu seja assassinada e entre nas estatísticas e posteriormente na impunidade”, diz em trecho do documento.
Quero dizer a todos e todas que acompanham meu trabalho em Riachão do Jacuípe e Região, o quanto é difícil e doloroso para mim escrever essas palavras. Escrever notícias para um jornalista é o melhor dos momentos, mas a que eu trago agora não é nada boa, fui agredida, coagida, ferida, dilacerada emocionalmente e psicologicamente.
Tenho a consciência leve e tranquila, da certeza plena de que faço meu trabalho jornalístico com toda ética e seriedade possível, mais do que isso, com coragem, determinação e acima de tudo amor. Mas eu cheguei no meu limite, ver a minha mãe padecer, passar por tantos desgostos, decepções e aflições nestes últimos dois anos, para mim tem sido árduo e penoso.
O maior orgulho da minha mãe são os meus diplomas, minha formação em JORNALISMO e pós graduação em COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL, os meus estudos, que ela tanto lutou para me ajudar a pagar. Mas aqui em Riachão do Jacuípe, minha terra, o seio de minha família, a minha profissão, as minhas atividades jornalísticas têm sido vilipendiada, distorcida e incompreendida, e por muitas vezes violentada, tudo isso só tem dado a minha mãe muitos dissabores.
Desde o ataque brutal, criminoso e violento que sofri na última quinta-feira (13), quando tive o meu carro apedrejado, destruído, a minha mãe está abalada e fragilizada, não se alimenta direito, não está dormindo bem, temendo que eu seja assassinada e entre nas estatísticas e posteriormente na impunidade. “minha filha, quem morre é quem perde a vida”, me diz ela a todo instante.
Isso tem me deixado mexida psicologicamente, abalada emocionalmente, pois a minha mãe é tudo para mim, a razão de minha vida, a cada intimação de processos que respondo, a cada ameaça, a cada ligação de pessoas que julgávamos ser nossos amigos, mas que quando se tornam notícia, partem como onças ferozes para cima de mim, a cada ataque eu vejo minha mãezinha definhar.
Por conta de tudo isso, resolvi me afastar da comunicação em minha cidade, NÃO POR COVARDIA OU MEDO, repito, NÃO POR COVARDIA OU MEDO, mas sim pela saúde e integridade da minha mãe, que é o mais importante agora, ela não suporta mais tantos ataques violentos e assédios judiciais direcionados a mim por conta de minha atuação jornalística na nossa cidade, vou me afastar também porque estou muito abalada emocionalmente, com meu psicológico fragilizado, e além de tudo, estou muito triste com esses últimos desdobramentos.
Vou mais uma vez buscar novos horizontes fora de minha cidade, fora da minha zona de “desconforto”, quem sabe né? Mas fica aqui o recado, A JUSTIÇA DE DEUS nunca falha. AQUI SE FAZ, AQUI SE PAGA. Obrigada a todos e todas por tanto carinho e acolhimento, principalmente a população jacuipense (os de verdade e que de fato gostam de meu trabalho jornalístico), mas infelizmente vocês agora perderão a sua VOZ COMBATIVA, mas meus amigos e amigas, deem a resposta para tudo isso, para todas essas atitudes de censura, para todas as mazelas de nosso Riachão, nas urnas em 2024, respondam com seu VOTO, elejam quem merece de fato, e que principalmente, TENHA BOM CARÁTER.
Agradecer imensamente aos amigos de profissão da imprensa de todo o Brasil que de alguma forma noticiaram, replicaram e repudiaram esse ataque criminoso que sofri, e fez um país inteiro e até mesmo os Estados Unidos, tomarem conhecimento deste fato hediondo. Agradeço aos meus sindicatos e associações, FENAJ, ABRAJI E SINJORBA, eu confio na POLÍCIA, eu acredito na JUSTIÇA. Todo meu amor a vocês, até a próxima, a gente se vê por aí…
ALANA ROCHA – JORNALISTA – DRT 5323/BA.
Alana Rocha
Alana Rocha, foi a primeira mulher trans jornalista da Bahia a fazer reportagens na TV aberta do estado, em 2017.
A vocação de Alana com a comunicação começou cedo na cidade de Riachão do Jacuípe, no interior da Bahia. “Desde criança sempre fui apaixonada pela comunicação, todas minhas brincadeiras envolviam jornalismo. A grande maioria de meus amigos de infância entravam na onda, quando vi que era mesmo o jornalismo que eu queria como profissão decidi entrar para o rádio na minha cidade natal Riachão do Jacuípe, comecei na rádio comunitária Gazeta FM e tive passagens pela rádio Jacuípe AM também”, relembrou Alana, em entrevista ao Me Salte.
Em 2009, ainda em Riachão do Jacuípe, Alana criou ou blog Hora da Verdade, inspirado no extinto programa de Márcia Goldschmidt. “Meu sonho de estar na televisão era tão grande que resolvi cursar jornalismo em 2012. Deixei minha mãe sozinha e partir para Itabuna, onde cursei o primeiro semestre. Lá, eu tive a minha primeira experiência com a TV, entrei como produtora na TV Itabuna (TVi).
Mas a saudade de minha mãe era muita, então resolvi voltar, consegui uma oportunidade de trabalho como assessora de comunicação da prefeitura de Riachão e transferi a faculdade para Feira de Santana, onde me formei em 2015”, relembra.
Em abril de 2017, Alana conseguiu uma oportunidade na TV Aratu, afiliada do SBT na Bahia, para tirar férias do jornalista Murilo Vilas Boas. “Era um sonho. Eu achava que começaria como produtora, auxiliar de produção ou redação e aos poucos iria galgando degraus, fiquei contente demais era a chance de minha vida. Entrei como temporária e acabei sendo efetivada em agosto de 2017.
Parecia que eu estava em um conto de fadas, uma transexual, no jornalismo, até então só se via falar de repórteres trans em entretenimento, mas nunca no jornalismo, ainda mais no jornalismo policial, que era a pegada do programa que eu fui escalada. Eu fui a primeira no Brasil”, destaca Alana.
O conto de fadas teve, contudo, um momento de turbulência. “Por um descuido meu acabei tenho minha imagem atrelada a uma propaganda política. Eu diz um storie no meu instagram cantando o jingle de um candidato ao governo, e não era nem pelo candidato, cantei mais por ser fã da cantora que interpretava a música. Alguém da assessoria que não me recordo agora entrou em contato comigo e perguntou se poderia usar o vídeo, eu achei que seria só nas redes sociais e então autorizei. Ele acabou passando na tv no horário eleitoral, e daí fui demitida”, explica Alana.