Jovens baianas negras despontam no cenário do Cinema Nacional

Cinema Independente abre portas para que elas disputem prêmios Brasil afora- Crédito: Mainá Diniz

Segundo dados do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), as mulheres negras são o grupo com a menor representação dentro do Cinema Brasileiro.

A pesquisa foi feita com base nas informações das bilheterias disponibilizadas pela Agência Nacional de Cinema (Ancine) entre 1995 e 2018, que analisou 240 longas-metragens considerados  os 10 mais assistidos de cada ano analisado.

Enquanto mulheres brancas chegam a ocupar 21% dos cargos de diretoras e 34% de roteiristas, mulheres negras sequer pontuam no circuito comercial.

É em busca de conquistar esses espaços que jovens baianas negras tem investido no mercado do cinema e do audiovisual brasileiros e já colhem alguns frutos.

Aíla Oliveira, de 23 anos-Crédito: Maiara Cerqueira

Como é o caso da diretora e roteirista Ana do Carmo, de 23 anos, co-fundadora da produtora baiana Saturnema Filmes, que já tem no currículo 17 prêmios nacionais e internacionais, diretora de oito curtas-metragens exibidos em países como EUA, Canadá, Escócia e Índia, além de dirigir o curta “A Mulher no Fim do Mundo”, vencedor de cinco prêmios no Brazil International Monthly Independent Film Festival, e de “Sol a Pino”, um dos três longas-metragens selecionados para a Gira de Projetos Zózimo Bulbul com apoio da Netflix e Telecine.

“É um mercado que não está interessado em nossas potências enquanto artistas, mas sim em tokenizar nossos corpos nos pagando 1/3 do que temos direito. Somos minorias nas salas de roteiro, onde muitas vezes estamos ali apenas para evitar “equívocos racistas”, como se um corpo representasse a totalidade da vasta negritude desse país. A maioria dos laboratórios de roteiro são todos voltados para longas-metragens e séries, cujas produtoras precisam ter grande porte e já dispor de uma produtora executiva que já tenha tido experiências com projetos grandes. Não somos ensinadas, tampouco incentivadas, a sermos empresárias”, analisa.

Adriele Regine tem 30 anos e é designer e diretora de arte da Saturnema Filmes- Crédito: Fluir Comunicação Estratégica

Estar no Nordeste, longe do eixo Sul-Sudeste, também dificulta o processo de conquistar mais espaço no mercado e emplacar produções. Para a produtora executiva da Saturnema Filmes, Rubian Melo, de 31 anos, essa distância do centro das negociações é o mais difícil na sua função.

“A questão é mais o acesso, o ‘como você entra no mercado audiovisual’, que é um mercado muito fechado. Por a gente estar no Nordeste, temos poucas produções. Vem de uma cultura do audiovisual que depende da Ancine e com esse desfecho atual da Agência, que não está mais financiando filmes, o cenário está ruim para todo mundo também”, explica Rubian Melo.

Mas, algumas iniciativas voltadas para a população negra tem abertos caminhos promissores e possibilidades de contarem suas próprias histórias, como: a APAN – Associação de Profissionais Negros do Audiovisual, a Wolo Tv, o Nicho 54, a Gira de Projetos Zózimo Bulbul, o Centro Afrocarioca, os festivais de cinema negro independentes, e eventos locais como o Nordeste Lab e o Películas Negras Lab: Formação de Roteiristas Iniciantes, este último promovido pela própria Saturnema.

Se postos como de diretor e roteirista são esmagadoramente ocupados por homens brancos, segundo o GEMAA, algumas funções como figurinista e direção de arte são ocupadas majoritariamente por mulheres. Adriele Regine tem 30 anos e é designer e diretora de arte da Saturnema Filmes.

Para ela,trabalhar nessa área foi uma decisão pelo amor à profissão e à arte, e também pela possibilidade de criar outros mundos a partir do cinema. Porém, esta pode não ser a realidade de outras jovens que encontraram na direção de arte o lugar.

“Acho importante a gente ocupar todos os espaços, mas a direção de arte é um dos lugares que mais as meninas se formam e trabalham. A gente precisa compreender se a escolha em ser diretora de arte é de fato uma escolha ou se é um lugar que a gente entendeu que  nos cabe. Eu entendo essa presença feminina na arte partindo desse lugar também de começar a questionar o quanto você está ali por querer estar mesmo, principalmente no cinema. Sempre nos é dado, nos empurrado que a delicadeza, o toque feminino, mas talvez a gente queira mais, né?! Para esse dia 8 de Março, o que mais importa é que a gente entenda o que a gente quer, e se quiser mais, entender que a gente pode querer mais”, declara Adriele Regine.