Fortaleza da desilusão, primeiro livro do escritor, é raro na forma e na possibilidade de ser encontrado
Tenta aí: digite “Fortaleza da Desilusão” no buscador da internet, inclua o nome do autor, Ferréz, e veja se encontra o livro. Nada, né? Não surgirá uma lista de possibilidades. Tente então ser mais específico, pesquisando em sebos virtuais. Nada ainda? Nem para venda, nem arquivo digital para baixar?
Você não está fazendo errado. Também tentei essas e outras alternativas e só achei um exemplar para comprar, em site que tem a desfaçatez de cobrar R$ 356,10 pelo único livro disponível. Não é fácil obter a primeira obra do escritor Ferréz, que ajudou a puxar o bonde da safra literária marginal contemporânea em São Paulo.
A tiragem de 1.500 exemplares, esgotada, foi lançada em 1997. Na época, ninguém deu bola. Ferréz contou diversas vezes a saga do livro em pequeno formato, enjeitado como criança sem pai – em vários vídeos e textos, estes sim encontráveis na internet, o autor narra essas peripécias. Tive sorte de garantir o meu por R$ 3,00, faz tempo, em um sebo do centro de São Paulo; e quem tiver o seu, que guarde com carinho.
É com essa coletânea de poemas – e não com Capão Pecado, de 2000, seu livro mais conhecido – que Ferréz iniciou a carreira, a correria e a correia de transmissão literária nas periferias de São Paulo. Fortaleza da Desilusão foi patrocinado pela empresa de recursos humanos na qual o autor era responsável pelo arquivo morto. O lançamento aconteceu em 22 de novembro de 1997, ano emblemático: no mês seguinte sairia Sobrevivendo no Inferno, histórico disco do Racionais MCs; e desde abril circulava a revista Caros Amigos, em que Ferréz viria a escrever e para a qual organizou três coletâneas de literatura marginal, históricas.
Fortaleza da Desilusão é obra duplamente rara, pois, além de dificilmente encontrável, não tem praticamente nenhuma relação com o tipo de literatura que Ferréz desenvolveria. Lendo o livro, não encontramos sinais estéticos que germinaram a partir daquela semente, pois são poemas concretistas e de amor; os livros posteriores de Ferréz solidificariam sua carreira como autor de contos e romances da revolta, da revolução, do revide dos pobres, do ódio fermentado nos cantos da metrópole.
A qualidade literária de Fortaleza da Desilusão é desigual. Os versos confessionais, amorosos, são somente a catarse de um jovem apaixonado; porém, as criações de estética concretista impressionam, e as leio lamentando que Ferréz não tenha publicado mais na mesma linha – linha, reta, plano, retângulos e outras formas geométricas. O poema sobre o vento, um triângulo cujas palavras vão se fechando em direção ao centro da figura, como o giro do redemoinho, faz jus ao movimento de poesia concreta criado na capital paulista pela tríade dos irmãos Haroldo e Augusto de Campos + Décio Pignatari. A continuação da estética dos poetas concretos não diminui a originalidade de Ferréz.
Se ele produziu outras peças do mesmo estilo, não publicou. Ainda bem que, na ausência de novos poemas, ganhamos um grande prosador, enquanto permanece quase desconhecido um interessantíssimo poeta concreto em Fortaleza da Desilusão. É ler, e ver, para crer.
Clique aqui e confira a leitura de três poemas de Ferréz.
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