Na segunda semana de março deste ano a vida de muitas pessoas foi pausada devido à pandemia do novo coronavírus. Entre elas, as mães que tiveram que parar suas atividades nas empresas em que trabalham ou continuar em home office. Mas na comunidade de Rio das Pedras a realidade de muitas mulheres não se encaixa em home office. São diaristas, babás, trabalham em escolas, salões de beleza, restaurantes e outros estabelecimentos dentro e fora da comunidade.
Na primeira semana de junho, quando começou a flexibilização do comércio na cidade do Rio de Janeiro, muitos trabalhadores retomaram de forma gradual sua rotina. Fator que fez com que muitas mães passassem a pagar cuidadoras de crianças, pois as escolas e creches públicas ainda estão fechadas.
Foi o caso de Michele Ribeiro, de 32 anos, auxiliar de serviços gerais, que precisou pagar alguém para tomar conta das crianças para não deixar os três filhos em casa sozinhos. Michele é mãe de Jonathan, de 6 anos, Jefferson, 10, e Maicon, 13, todos alunos da rede pública de ensino em Rio das Pedras. “Quando eu retornei ao trabalho foi muito difícil porque no momento não tinha ninguém para ficar com eles. A solução foi a cunhada de uma colega de trabalho”, conta Michele.
A auxiliar administrativa Yasmin Alves, 22, também teve que pagar uma pessoa para cuidar do filho Bernardo, de 7 anos. “Senti muita dificuldade, inclusive no bolso. Tive que pagar a mais para a moça que cuida dele enquanto trabalho. Como a escola não está funcionando, ele precisa ficar em período integral na casa dela”. Durante o período em que esteve em casa, Yasmin fala que conseguiu curtir e ter um tempo a mais com o filho. “Foi uma delícia, curti ele ao máximo, criei o hábito de fazermos alguma atividade em casa juntos. Antes não tinha tempo por conta do trabalho”.
Quem também conseguiu curtir bastante a família antes de retomar ao trabalho foi a garçonete Gabriella Alcântara, 22, mãe de duas meninas: Sophya, 8, e Lenna, 5. No período de quatro meses, Gabriella teve suas atividades suspensas e aproveitou o tempo para acompanhar a rotina das filhas e dar mais atenção à educação delas.
Com o retorno ao trabalho, a garçonete teve ajuda da avó das meninas, pessoa de confiança que conhece mais a rotina de suas filhas. “Tem três meses que voltei ao trabalho. Foi bem estranho porque você vê que nem todo mundo está se protegendo nas ruas. É cansativo”, desabafa Gabriella, que toma todos os cuidados no trajeto por conta das filhas e da avó que fica com elas.
A realidade em Rio das Pedras é de muitas mães que, nem sempre, têm a família por perto para as ajudar. Situação contrária a de quem tem uma rede de apoio e consegue até ter um alívio por não precisar tirar do dinheiro que pagaria outras despesas, incluindo alimentos. Muitas mães pediram demissão por não ter uma rede de apoio ou não conseguir pagar por esse gasto a mais.
Lohana Velasco, 26, mãe do Samuel, 5, e de Mahina, 3, teve que fazer essa escolha. Ela já trabalhou em empresas fora da comunidade de Rio das Pedras mas, desde o final de 2019, trabalhava em uma loja de biquínis dentro da comunidade para ficar mais perto de seus filhos.
A loja de biquínis em que Lohana trabalhava cumpriu o isolamento, reabrindo as portas somente em junho. Ela teve que levar os filhos para a loja todos os dias porque as escolas estavam fechadas e não tinha como pagar uma cuidadora. “Foi horrível retornar ao trabalho. Morria de medo. Eu tive que levar eles comigo e a cada segundo eu limpava tudo. Foi muito estresse. Toda hora pedindo para eles não mexerem em nada, colocando as máscaras neles. Era difícil eles ficarem com ela”, desabafou Lohana, que decidiu pedir demissão em agosto. Atualmente ela está trabalhando como designer de sobrancelhas em casa e atende algumas clientes com todos os cuidados.
Todas as mães que enfrentam a dupla jornada de trabalho e precisam conciliar os horários com os dos filhos e as atividades profissionais em tempo integral compartilham da mesma situação. Algumas histórias, mesmo diferentes, convergem. São histórias de mães que, mesmo dividindo a rotina com os pais dentro de casa, encontram muitas dificuldades nas empresas em que trabalham, pois muitas não entendem ou não enxergam essas mulheres profissionais como mães também. Todas as mães ouvidas disseram que não mandariam seus filhos para a escola sem uma vacina para a Covid-19.
Esta matéria foi produzida com apoio do Fundo de Auxílio Emergencial ao Jornalismo do Google News Initiative.