favelada
Morro do Fallet Fonte: Nice Lira

Contar a minha história de vida até chegar à ANF é algo que demanda tempo, mas vou tentar resumir para vocês. Minha identidade favelada não nasceu comigo, e sim, com o caminhar da vida.

Sou uma mulher pernambucana, que passou a se enxergar como preta depois que entrou para a faculdade. Nunca tive noção de onde eu vim, qual era a minha origem.

Quando eu tinha seis anos, minha mãe veio para o Rio de Janeiro, com dois filhos, para tentar uma vida melhor e fugir da violência doméstica que sofria quando o meu pai bebia.

O primeiro lugar onde moramos no RJ, foi na Grota, Complexo do Alemão. Lá eu vivi os melhores anos da minha vida, mas até eu ter essa referência, foram muitos sustos.

Identidade favelada e o medo

Só quem mora em favela sabe qual é a realidade, e foi lá que ouvi os primeiros tiros da minha vida. Dizem que a gente se acostuma, mas ninguém acostuma a sobreviver com medo.

Não estou aqui para falar de coisas ruins, e sim sobre quando me reconheci como favelada, pois por muitos anos durante as entrevistas de emprego eu escondi o local que eu morava.

Eu também morei no Morro do Zulú, em Niterói, e moro há mais de vinte anos no Morro do Fallet, em Santa Teresa. Foi aqui que descobri a minha identidade, foi aqui que minha mãe conseguiu comprar a tão sonhada casa. Foi aqui que cresci, foi aqui que aprendi a viver, e foi morando aqui que eu me formei.

Nada foi fácil, fui mãe aos 18, mas o meu filho sempre foi, e sempre será o meu maior incentivo. Hoje crio um menino preto, de 14 anos, na favela. Hoje, o medo que sinto, não é por mim. Vocês sabem sobre o que estou falando.

O orgulho de uma favelada

Sou a primeira pessoa com diploma universitário da minha família, mas até chegar aqui, foram cinco vezes realizando a prova do ENEM, até conseguir a tão sonhada bolsa do PROUNI.

Já fiz de tudo um pouco, trabalho desde os meus 16 anos, sempre gostei de aprender. Já contei que fui MC? Isso mesmo, eu cantava Funk, e amava o mundo em que eu vivia. Eu tinha orgulho ao falar de onde eu era, sobre o morro que eu representava.

Passei por tudo de cabeça erguida, pois foi assim que eu vi a minha mãe fazer durante toda a vida. Descobri que com humildade e honestidade, eu poderia realizar meus sonhos. E sigo realizando.

A identidade da favela

Dizem que “quando você sai da favela, ela não sai de você”, acredito que isso é muito real. Favela é sinônimo de alegria, solidariedade e luta. Essas características te acompanham onde você for.

Hoje, falo com orgulho que sou favelada, mas já fui julgada por isso. Os projetos sociais pelo qual passei, me fizeram entender a importância de lutar pelo meu território, pelo meu povo. Então, que julguem.

Fazer parte da ANF é poder conhecer outras histórias como a minha, é poder contar essas histórias. Precisamos falar por nós, e espero aproveitar cada segundo dessa experiência.

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