Os moradores de favelas do Rio de Janeiro, locais tratados historicamente com desprezo pelo poder público e pela sociedade, agora têm a chance de cobrar por direitos e serem ouvidos pelo governo do estado e pela prefeitura do Rio.
Ambos os poderes estão criando mecanismos de contato com a população de territórios periféricos com o objetivo de entender quais políticas públicas são necessárias para o desenvolvimento social das comunidades, como o Conselho Municipal de Favelas, estabelecido em janeiro pela prefeitura do Rio, e o Plano de Metas Favela Cidadã, proposto pelo deputado estadual Waldeck Carneiro e sancionado em dezembro de 2020 pelo governador em exercício, Cláudio Castro.
De acordo com a prefeitura, “o objetivo do Conselho de Favelas é aprimorar a elaboração, execução e o acompanhamento das políticas públicas para esses territórios e trazer para o debate público vozes e ideias que podem apresentar para os diversos setores da cidade todas as potências produzidas nesses locais”.
A iniciativa do conselho está sendo coordenada pela Secretaria de Governo e Integridade Pública e conta com a participação de representantes das secretarias da Juventude Carioca, de Política e Promoção da Mulher e de Ação Comunitária.
Para construir este instrumento de participação popular, a prefeitura abriu uma consulta pública, encerrada em março, para que a população pudesse escolher os critérios para a formação do Conselho Municipal de Favelas.
Para o secretário-geral da Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj), Felipe dos Anjos, os conselhos propostos pelo poder público são um caminho para maior participação popular. “Esse tipo de ferramenta gera controle social, uma das medidas mais efetivas para a fiscalização do poder público e combate à corrupção”.
Contudo, o secretário pondera sobre a importância de avaliar como essas decisões dos conselhos consultivos ganham força, porque muitas vezes eles não são deliberativos, ou seja, não têm poder de decisão, apenas indicam ao poder público o que precisa ser feito, mas quem decide é o Poder Executivo. “Se funcionar da forma que o conselho tem que funcionar, deliberativo e com participação ampla da população, será uma saída para muitos problemas que a gente vive hoje”.
No âmbito estadual, o Plano de Desenvolvimento, Cidadania e Direitos em Territórios de Favela e demais Áreas Populares (Plano de Metas Favela Cidadã) visa fazer com que o Estado crie políticas duradouras para a população dos territórios periféricos e que elas sejam pensadas, aplicadas e avaliadas em conjunto com a população. A ideia é que a sociedade civil, especialmente entidades e coletivos desses locais, participem de um comitê de monitoramento para atuar na fiscalização do cumprimento dessas políticas.
Criado por determinação da lei 9.131/20, de autoria do deputado estadual Waldeck Carneiro, e custeado pelo Fundo Estadual de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais, o plano será avaliado a cada dois anos e prevê a criação do Índice de Desenvolvimento, Cidadania e Direitos em territórios de favela e demais áreas populares (IDCD Favela).
O parlamentar destacou a desigualdade no Rio de Janeiro, o problema que ele considera o mais grave e que ganhou ainda mais visibilidade durante a pandemia, como um dos motivos que o levou a propor a lei. Para Carneiro, outro problema é a visão distorcida e preconceituosa sobre as favelas, que atrapalha o investimento em políticas públicas e impede que esses espaços sejam vistos, ouvidos e incluídos enquanto parte da cidade. “A gente não consegue sair desse caso crítico de desigualdade sem enfrentar alguns dos nossos problemas estruturais. As favelas são cidades e precisam ser contempladas pelas políticas públicas”.
O deputado estadual reforça que, mesmo que a lei tenha sido sancionada pelo governador, ela ainda precisa ser regulamentada. E para que tudo isso aconteça efetivamente, precisa de vontade política ou pressão social suficiente para que o governo a tire do papel e a execute.
Ouça a entrevista com o deputado estadual Waldeck Carneiro no Spotify da Agência de Noticias das Favelas (ANF).
Matéria originalmente publicada no jornal A Voz da Favela de abril de 2021.