A frase da imagem acima é batida, porém, atemporal. Só que, dentro da realidade carioca pode ser adaptada para “Não existe polícia atirando a esmo em bairro nobre”. Um fato recente, vivenciado na Favela do Jacarezinho, Zona Norte carioca, exemplifica bem essa releitura.
No último dia 14, uma operação inexplicável levou a Polícia Civil a fazer incursões aqui logo no final da manhã de domingo. Foi utilizado o chamado Caveirão Aéreo, anteriormente conhecido como Helicóptero Águia. Durante os voos rasantes sobre a comunidade, policiais disparavam de cima para baixo, na teórica tentativa de atingir bandidos em solo. Mas não é preciso ser um gênio da aviação ou atirador experiente para imaginar a dificuldade de se acertar alvos em movimentos quando também se está em movimento, ainda mais na velocidade com que um helicóptero se desloca.
Até então, você deve se questionar, poderia se tratar de só mais uma estupidez estratégica, diminuindo suas chances de êxito em alcançar o inimigo desejado. Poderia ser só isso, não fosse o fato de que não estamos falando de tiros disparados com alta possibilidade de erro em um território de guerra evacuado. Estamos falando de uma favela, no coração do subúrbio carioca, com, aproximadamente, 70 mil moradores, onde tal prática coloca a vida de todos em risco.
Não se pode admitir que a polícia atire a esmo em busca de um inimigo, em um local com uma população tão grande. No mais, é interessante mencionar que a polícia age como se todos fossem suspeitos – e alvos – em potencial, sendo que 99% das pessoas que aqui vivem não são envolvidas com o comércio de drogas.
Não concorda com os números? O IBGE diz que 1.4 milhões de pessoas moram nas favelas cariocas. Se você apontar o número de 10% desse contingente que supostamente poderia estar envolvido no comércio varejistas, teremos 140 mil bandidos na Cidade Maravilhosa. Levando-se em conta de que temos um efetivo de 22 mil policiais militares nos batalhões, acredita mesmo que, se os números fossem esses, se a proporção fosse de sete bandidos para cada PM, o caos não seria bem maior?
Voltando ao ponto, não se pode admitir essa total desvalorização da vida na favela, em que a morte de um inocente é banalizada debaixo do manto de combate ao tráfico e ao inimigo número um do Estado. Corroborando a irresponsabilidade e os riscos desses tiros a esmo feitos de uma aeronave em movimento, temos os relatos de policiais da UPP Jacarezinho, em que, em áudios viralizados em grupos de Whatsapp, reclamam que os tiros proferidos do helicóptero quase acertaram a base da unidade, chegando a acertar um veículo do outro lado da rua do contêiner da Unidade de Polícia Pacificadora. Tal fato comprova como tais disparos são irresponsáveis e criminosos.
Essa prática só é possível em uma cidade onde até a bala perdida tem CEP.