Com o fim do auxílio emergencial, ações sociais devem voltar a ser a única opção para alimentar milhares de pessoas durante a pandemia
“Não tem futuro sem partilha” cantou a Estação Primeira de Mangueira no desfile do ano que passou. A escola de samba parecia prever em um de seus versos o que estava para acontecer em 2020, um ano diferente de todos em muitos aspectos, inclusive neste: sem partilhar o pão, como será o amanhã?
A pandemia do novo coronavírus, que começou em março no Rio de Janeiro, fez com que muitas pessoas fossem forçadas a parar de trabalhar, em especial os trabalhadores informais e os mais pobres, que não têm a opção de fazer home office. Outras, que tinham empregos aparentemente mais seguros, também se viram desamparadas ao serem demitidas ou terem os contratos de carga horária e salário diminuídos.
O auxílio emergencial disponibilizado pelo governo federal somente entrou em vigor após o grande clamor popular, que teve visibilidade pela pressão dos partidos de oposição. Até então, o futuro de milhares de famílias estava sendo garantido por iniciativas de pessoas que partilham, como Carla D’Avila, professora da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro e especialista em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Ela trabalhou por quatro anos em uma escola no Morro do Engenho, no Engenho da Rainha, Zona Norte da cidade, e percebeu que faltava tudo para a população local. “São pessoas muito necessitadas no sentido de políticas de saúde, de alimentos, de tudo. Lá dentro não tem políticas públicas efetivas, atividades culturais ou qualquer ação do Estado para a população”.
Quando a pandemia chegou, Carla já tinha saído da escola, mas a mãe de um ex-aluno entrou em contato com ela relatando que muitas pessoas tinham perdido o emprego porque eram diaristas ou trabalhavam em lojas que tinham sido fechadas.
“Então tive a ideia de fazer um mutirão e comecei uma campanha nas redes sociais para arrecadar dinheiro e ajudar as famílias de lá. Montamos cestas básicas grandes para cada família de forma que desse para pelo menos dois meses de alimentação e higiene. Conseguimos contemplar 35 famílias”.
A ação de Carla foi uma das muitas iniciativas que ajudaram tantas famílias nesse momento tão difícil de pandemia enquanto não havia o auxílio emergencial. No mês de setembro, no entanto, o governo federal anunciou que o benefício, que era de R$ 600, duraria até o fim de 2020 e o valor seria cortado pela metade, R$ 300.
Milhões de pessoas voltarão ao cenário de angústia e incerteza em 2021. O Ministério da Economia já deu a data para o término do auxílio, mas e o fim da pandemia, quando será? Enquanto a resposta não chega e novas medidas não são tomadas para os primeiros meses de 2021, a aposta é de que o carioca precisará continuar a partilhar para que pessoas tenham não só futuro, mas também presente.
Matéria originalmente publicada no jornal A Voz da Favela de dezembro.
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