Ninguém deveria chorar pelo simples fato de comer

Um relato emocionante e verdadeiro sobre a realidade da fome que assola a tantos.

Doações recebidas pela A.M.I.G.A.S - Associação de Mulheres de Itaguaí Guerreiras e Articuladoras Sociais _ foto: arquivo pessoal

Em mais um dia de domingo , onde servimos refeições caseiras gratuitas, chegamos na cozinha com todo o entusiasmo para o preparo do cardápio do dia: feijão , arroz , farofa , frango refogado e uma suculenta salada de legumes.

Vale ressaltar que desde janeiro, com o fim do auxílio emergencial, foi possível perceber  as famílias que não estavam conseguindo fazer seus próprios alimentos, por falta de dinheiro para comprar o gás de cozinha. Então passamos a oferecer, de graça, refeições prontas todas às quartas-feiras e domingos, preparadas com as doações dos amigos e moradores.

A cada semana a demanda aumenta, devido a toda problemática com o valor irrisório do tal Auxílio Emergencial (que não tem ajudado em nada, essa é a grande verdade). Aumentamos a oferta dos alimentos justamente para garantir um mínimo de segurança alimentar, principalmente das crianças e idosos. É um imenso trabalho para obtenção dos donativos, mas toda semana dá pra sentir a satisfação de conseguirmos aquecer os corações e proporcionar a nutrição para os corpos tão calejados pela fome.

Porém, nesse último domingo (30/05), enquanto já estávamos servindo o povo, chegou um moço, de nome Renato, que entrou na fila (com distanciamento social, é claro) e perguntou se era realmente verdade que ali servia comida sem cobrar nada. O pessoal da fila respondeu que sim, e ele então, meio incrédulo, agradeceu à Deus pela oportunidade de estar ali.

Quando eu o servi, imediatamente ele ficou espantado, parecia não acreditar no que via : um prato de comida colorido e bem servido. O cheiro estava ótimo, ele também comentou. Mas quando se sentou e ajeitou o seu prato, começou a chorar copiosamente, orando em voz alta, agradecendo a oportunidade de comer, pois estava sem se alimentar a alguns dias.

Eu e todos que estávamos na cozinha choramos junto, tamanha a emoção daquele homem simplório (parecia pelo sotaque ser do interior), e a gratidão pelo simples fato de poder comer um prato de comida.

Com o coração totalmente quebrantado e grato à Deus por estar nessa missão de tentar minimizar os impactos da fome e da miséria nesses tempos sombrios da pandemia, em lágrimas, pensei : Ninguém deveria chorar pelo simples fato de comer!

A vida e a alimentação de qualidade são DIREITOS HUMANOS e não artigos de luxo, para poucos. Não há como não se revoltar, em pleno século XXI, ainda assistirmos tanta desigualdade social e a alta escala da fome, ainda em meio à uma pandemia, cujas pessoas mais vulneráveis são as vítimas com mais possibilidades de contágio e letalidade. Uma desgraça humanitária que anda bem juntinha com a tragédia sanitária, combinação perfeita para os altos índices de mortes. Estão aí as estatísticas portanto que não me deixam mentir.

O vírus e a fome matam mesmo !

Renato emocionado com seu prato de comida
Refeição que preparamos e entregamos a cada um

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