Nos últimos dias, a movimentação é intensa para a realização da III Marcha das Mulheres Negras no Centro do Mundo. O evento acontece dia 30 de julho, em Copacabana, no Posto 4, a partir das 9 h. É uma das principais mobilizações sociais que envolvem a questão racial, a luta de gênero e a liberdade religiosa.
Nunca esquecerei quando o Comitê Olímpico Internacional excluiu as religiões de matrizes africanas nas celebrações das Olimpíadas no Brasil. O COI privilegiou as religiões monoteístas, principalmente o cristianismo, que é usado até hoje para nos escravizar.
Sempre corre uma lágrima quando vejo uma família negra indo pra igreja. É como se nada mais tivesse jeito, é como se a luta realmente fosse em vão. Ainda mais quando vemos casos de pastores que demonizam os orixás, mostrando total falta de respeito e desconhecimento histórico. Às vezes, me parece que um dos maiores inimigos do povo negro no Brasil é o cristianismo.
Primeiramente, o catolicismo apoiou a escravidão para manter a expansão da Igreja. Depois, o protestantismo trouxe a demonização da cultura, da arte e das religiões de matrizes africanas. Uma das grandes estratégias é falar mau da cultura negra. Ainda hoje, os neopentecostais jogam pedras em crianças que frequentam os terreiros, invadem nossas casas e tentam destruir nossa história.
Nas favelas, a situação é mais grave. A influência de pastores sobre algumas comunidades chega a alcançar o poder paralelo. Não são raras as histórias de terreiros atacados, pais e mães-de-santo achacados e famílias inteiras expulsas de suas comunidades – mesmos aquelas que tanto ajudaram na conquista dos barracos, chamados de “tias” e “tios”, e que na época de São Cosme e São Damião distribuem doces para a criançada.
A herança da escravidão é todo o ódio à descendência africana, gerando as muitas violências que sofremos. Com o recente Golpe de Estado para a destruição dos direitos sociais e trabalhistas, aliado à crise geral da gestão pública, as oligarquias estão ocupando os setores abandonados pelo Estado. No Rio de Janeiro, a Federação do Comércio (Fecomércio) aproveitou a falta de estrutura da Polícia Militar para criar sua própria milícia, que age nas regiões de comércio e pontos turísticos.
O Programa de Policiamento Presente, conhecido como Lapa Presente, Aterro Presente, Lagoa Presente e Méier Presente, age para tirar a população negra das ruas. Quem não está produzindo pro capital ou mesmo sem documento de identificação é considerado suspeito e será levado para delegacia para prestar esclarecimentos, ficando por lá até que sejam apresentadas provas suficientes para a privação de liberdade ou para ser mantido fora de circulação pelo máximo de horas possível.
O modus operandi já é conhecido pela população. A repressão dessa milícia é forte. 25% do efetivo é composto por pessoas comuns, que agem segundo convicções pessoais baseadas em influências sociais como a religião e a televisão. Esses profissionais abordam majoritariamente homens e mulheres negras, procurando motivos para a detenção, até que, finalmente, acontece o “desacato de autoridade”. Mais um detido para a meta! A Fecomércio agradece, volte sempre!
Em 4 de julho, Nego Álvaro, músico do Samba do Trabalhador e um dos realizadores da roda mensal de samba no Beco do Rato, foi levado sem motivo algum por agentes do Lapa Presente à 5a Delegacia de Polícia. Em vídeo amplamente divulgado nas redes sociais, fica nítido que, apesar de apresentar documentos, ter sido revistado e nada de ilícito ser encontrado, ele foi obrigado a acompanhar os agentes até a 5a DP.
Sofrendo todo esse reflexo estão as mulheres negras, que vão estar em marcha no domingo e sempre seguram as pontas na criação, na educação, na alimentação e na luta por moradia. Ainda precisam enfrentar os padrões estéticos que as proíbem de engordar e de usarem seus cabelos naturais. Ainda bem que a questão estética está sendo vencida com muito cachos e empoderamento. Uma sobe e puxa a outra, e toda a família vem junto.
Pelo fim das oligarquias e pela liberdade da população negra! Axé!