Viver numa cidade como o Rio de Janeiro é um misto de estupor e aventura. Este colunista, que gosta de relatar como é o cotidiano dessa cidade, dessa vez passou por uma situação periclitante. Como todo carioca nato que sempre conviveu com a chamada guerra às drogas, sempre me senti imune quanto a passar por uma circunstância desse tipo: bater de frente com um “bonde do mal”.
Saí de minha casa, em Santa Teresa, para me encaminhar para o Rock in Rio e fazer a nossa cobertura diária do festival. O colaborador Talys Mota está nos levando e trazendo para casa todos os dias. Hoje, que é o dia do seu aniversário, ele sugeriu que a gente fosse para o RIR pelo Alto da Boa Vista – não que a gente tenha esquecido guerra de facções que está rolando na Rocinha, mas fomos confiantes que não iria acontecer nada.
Ledo engano. Ao subirmos pela Estrada do Sumaré para pegar as Paineiras e seguir para o Alto, vimos um homem sentado na sua moto, num platô. Parecia vigiar o caminho para alguém. Mais acima, no meio da estrada, um grupo de urubus estava agitados, como se farejassem algo: “Ih, Talys, acho que deve ter algum defunto pela mata. Nunca vi urubu andar assim na pista de bobeira”, disse eu.
Ele concordou comigo e seguimos caminho, até que avistamos um homem armado com fuzil efetuando vários disparos numa viatura da PM que estava parada. Nosso motorista Talys imediatamente deu o sinal e descemos numa ré desenfreada pelas curvas do Sumaré.
– Eles estão seguindo a gente, Julinho?
– Não, mano.
Porém, uns 300 metros depois, uma moto aparece na minha visão. Pedi que ele parasse o carro: “Parceiro, eles estão vindo aí”. Paramos e, para o nosso espanto, eles também param. Vêm falar com a gente. Apesar da gravidade da cena, eu e Talys ficamos tranquilos. Ao ver nossa calma, o cara também se tranquilizou. Viram que não éramos policiais, e mandaram a gente esperar o bonde descer. Um comboio de mais de 20 carros, lotados de homens armados até os dentes, passaram por nós.
Tudo parecia terminado, mas, no caminho, ainda fomos abordados mais duas vezes pouco depois: primeiro, por um grupo de bandidos que seguia a pé, perto da residência oficial do Arcebispo do Rio de Janeiro. Eram armas de vários calibres. Inclusive uma .50, arma capaz de derrubar aviões e helicópteros. Não chegaram a nos parar, mas nos abordaram rápido com as mesmas perguntas: se a gente tinha visto policiais no caminho e tudo mais.
No terceiro e último bonde que passou por nós, um traficante gaiato ainda pediu um “bonde, rapidinho” para a gente, o que gentilmente declinamos…