Há muito tempo que se fala em construir muros nas favelas do Rio de Janeiro. Desta vez, o governo conseguiu encontrar um subterfúgio para realizar seu intento: a questão ecológica. Com a desculpa de que os muros são para que a favela não avance dentro dos chamados eco-limites, vem cercando as comunidades, com uma política segregacionista, que se tornou manchete nos principais jornais do Brasil e do mundo.
Duas comunidades já estão com os muros sendo construídos. Sabe-se, no entanto que uma, em especial, nunca desmatou as áreas verdes: o Santa Marta. “Um verdadeiro besteirol! A comunidade do Santa Marta sempre respeitou os eco-limites”. Garante Antonio Guedes, uma das principais lideranças do Santa Marta. Outra liderança, o DJ Thiago, jovem que realiza eventos na comunidade, também se manifestou contra: “Achei esquisito, achei estranho, achei uma falta de respeito com a comunidade. Eles estão querendo trancar a gente. A comunidade nunca avançou pra dentro da mata. A gente ta se sentindo em uma vila fechada, olhando pro muro. Nós sempre tivemos a liberdade de ir no mato, pegar uma jaca, que era cultura nossa, agora a gente chega lá e dá de cara com um muro. Pra que gastar essa grana com um muro com tanta gente com dificuldade para morar? Esse dinheiro podia ser revertido para casas ou cultura”. De fato, a famosa comunidade em Botafogo, zona sul do Rio, palco de tantas histórias tendo como exemplo a visita do pop star Michael Jackson, sempre permaneceu do mesmo tamanho, crescendo só para cima, ou seja, através de construções em cima das lajes.
De acordo com Isis Cardoso, líder do Movimento Popular de Favelas, essa questão vinha sendo discutida há algum tempo no favela bairro: “Todos foram unânimes em dizer não aos muros e sim a conscientização para que a população respeitasse os limites, evitando o desmatamento nas áreas de preservação”. Parece mesmo que só o poder executivo quis a construção dos muros, pois até o presidente da comissão de meio ambiente da ALERJ, deputado André Lazaroni (PMDB), é contra. Questionado sobre o assunto ele disse: “É uma medida paliativa que não resolve a questão principal. Ninguém vai deixar de invadir por causa do muro. Uma opção poderia ser o monitoramento por satélites, que funciona bem, usando a tecnologia ao invés de muros. Isso tudo é para fazer mídia. A principal preocupação deveria ser as pessoas morarem decentemente”.
Nem todos pensam igual, como é o caso de Willian Oliveira, presidente do Movimento Popular de Favelas e ex-presidente da Rocinha: “O muro que está em discussão vai impedir que muitas pessoas venham passar por situações desumanas, porque toda vez que cresce um barraco na favela, ele vai utilizar da mesma água, da mesma luz e do mesmo saneamento básico que já é precário. O crescimento não é bom, principalmente para nós moradores de favelas. O Eco-Limite ou Muro não vai só trazer preservação ambiental, mas também qualidade de vida”.
A opinião de William, porém, parece não encontrar muito eco. Fomos buscar a opinião de um ambientalista, especialista no assunto, que corrobora a não construção dos muros. Sérgio Ricardo, atual subsecretário de meio ambiente de Nova Iguaçu também se mostra contrario: “Os eco-limites podem ser naturais ou físicos. Físicos são os muros segregacionistas como o de Sergio Cabral. Os naturais podem ser hortas comunitárias, cercas vivas, plantio de ervas medicinais, como o Verdejar faz em Inhaúma, ou ainda reflorestamento e pomares comunitários, nos quais as comunidades podem interagir e vivenciar um ambiente saudável redescobrindo o convívio com a natureza”.
Como a construção dos muros já começou, agora só resta acreditar que a sociedade ficará de olho para que outras políticas segregacionistas não sejam implantadas, distanciando ainda mais a cidade que partida.
Texto: André Fernandes – Foto: Zô Guimarães