Cuidar da pele preta em produções audiovisuais é o trabalho de Inês. FOTO: @bidipontes

Inês Cassoma, 22 anos, moradora da comunidade Zumbi dos Palmares, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, é filha de refugiados angolanos e tem sido motivo de inspiração e representatividade de pretos apaixonados por maquiagem e audiovisual.

A maquiadora percebeu, a partir de suas vivências, que havia um déficit de maquiadores com preparo para trabalharem em peles pretas. Entre os poucos maquiadores que encontrava, alguns tinham experiência focada em casamentos, aniversários e formaturas.

Então ela decide cobrir essa ausência e cria a Cassoma Beauty, uma das poucas empresas brasileiras de maquiagem com foco em pessoas negras e em como a pele é capturada pelas câmeras.

Na imprensa internacional

Entre as atividades que desenvolve, Inês recebeu convite para participar de uma reportagem através da qual ela falou de sua experiência, dos efeitos das políticas públicas e como o cenário político influencia na geração de renda.

E sua visão foi tão inovadora e necessária, que essa reportagem foi repensada e então propuseram que parte fosse publicada no jornal El Pais, da Espanha. A outra parte foi divulgada em um dos maiores jornais do mundo, o New York Times.

Inês fala da sua felicidade por estar ocupando esses novos espaços, da satisfação de ter sua voz ampliada para fora de sua comunidade, o quão bom é ser ouvida. E não só por sua carreira como maquiadora. Mas por trazer o entendimento que a maquiagem é um ato político, e como o governo e a política influenciam na vida de mulheres que, para sobreviver, criam inúmeras estratégias.

Representatividade midiática

Nos últimos anos há um crescimento enorme de atores, apresentadores, cantores, influenciadores e artistas pretos na mídia. Apesar de muitos obstáculos e do preconceito ainda forte, estão sendo valorizadas identidades e, com isso, surge a necessidade de profissionais aptos para trabalharem peles negras, respeitando toda sua pluralidade.

Inês, que foi educada com referências de grandes artistas pretos, em meio à valorização da cultura negra, percebeu que no Brasil ainda havia a ausência na representação desta beleza. Através das rodas culturais na Baixada Fluminense, começou o contato direto com artistas das periferias, um dos aprendizados que desembocou no Cassoma Beauty.

No set de filmagem

Ela conta que o processo de iluminação dos sets de filmagem foi desenvolvido com foco em peles brancas, usadas como teste para medição de luz. E quando não há um profissional que saiba driblar esse racismo estruturado no audiovisual, acaba não acontecendo um bom trabalho, desvalorizando artistas pretos e sua imagem.

Aí entra o trabalho da Cassoma Beauty, sanando essa ausência de profissionais na cena do audiovisual. Em 2022, a empresa gerou renda com trabalhos diretos para diversas mulheres, maquiadoras e outras profissionais de beleza, como na feitura de penteados afro.

Sua equipe é pensada e personalizada com foco em cada projeto desenvolvido pelas produções audiovisuais. Ela trabalha de maneira diversificada, podendo gerar ainda mais renda e serviços para várias pessoas.

Expansão do negócio

Em novembro, a empresa participou do maior evento de inovação da América Latina, o Rio Innovation Week, através de uma seleção do SEBRAE. Inês apresentou sua empresa como startup do ramo da beleza, que pensa e trabalha em inovação. Isso traz a possibilidade de inserir no mercado profissionais aptos a trabalharem com peles pretas, num ambiente que foi desenvolvido para peles brancas.

Ela também nos fala de seus desejos para o futuro: criar uma plataforma com o intuito de passar todo esse conhecimento obtido, para que se multiplique a quantidade de profissionais que possam atender as demandas pretas.

Mostrando a cara

Outro convite recebido por Inês foi a apresentação de sua história no TEDX Barra da Tijuca, que teve como tema “Elas buscam”, em uma edição voltada para mulheres que inspiram. Na ocasião, ela reviveu algumas dores como mulher negra e todo o seu esforço para que essas histórias não pudessem machucá-la.

Uma das vivências relatadas foi quando seus colegas de sala falavam que, por conta de sua cor de pele, não poderia ter uma relação amorosa. Além das decepções, ela falou da importância das referências negras que teve em toda a sua formação, e como isso a ajudou a driblar a violência do racismo.

Jantar corporativo

Faz poucos meses que Inês ofereceu seu primeiro jantar corporativo. Ela, seus colaboradores e clientes puderam compartilhar da culinária de países africanos, relembrando a ancestralidade e servindo de exemplo para as próximas gerações.

Quando questionada sobre onde vê a sua empresa daqui um ano, ela fala de seu desejo, e não de sua visão, por acreditar que essa possa delimitar possibilidades. Inês deseja ver sua empresa gerando renda para pessoas negras, potencializando talentos através da estética, usando a maquiagem e o cabelo como ferramentas políticas potencializadoras da autoestima.

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