O Governo do Estado do Rio de Janeiro fechou, na Lapa, um centro de Direitos Humanos voltado para os descendentes das vítimas do maior sequestro da história: o dos africanos que vieram para serem escravizados no Brasil. Só no Cais do Valongo, na zona portuária do Rio de Janeiro, podem ter chegado mais de um milhão de pessoas, entre homens e mulheres que, além do trabalho forçado, ainda sofreram estupros, gerando filhos mestiços, muito conhecidos como mulatos.
Desde pequeno, sempre me perguntei o por quê de não “tomarmos as rédeas” da sociedade e mudarmos o nosso rumo, já que somos maioria. E aos 37 anos, consegui algumas respostas; vejam se são as mesmas que as suas.
A principal de todas as barreiras é a aceitação da condição natural de ser negro e de nascer negro em uma sociedade baseada na constante tortura ao povo preto. Desde o sequestro na Africa até as atuais humilhações que sofrem os descendentes das vítimas do trabalho forçado, há uma flagelação muito grande e pior que a física: a psicológica
Além de não haver nenhum pedido de desculpas, como fizeram com os judeus vítimas do holocausto nazista, sempre que damos um passo rumo ao bem-estar social, somos barrados brutalmente, seja como no assassinato da Vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro, ou como quando um oficial do exército israelense sofreu preconceito dos policiais em Telaviv por ser negro.
Não importa: somos sempre os mais frágeis e os únicos que “não merecem respeito”, nem de quem sofreu um pouco do que sofremos durante todos os últimos 6 séculos, tampouco dos traficantes evangélicos que destroem os Terreiros de Candomblé e Umbanda e torturam os sacerdotes nas favelas.
Somos um povo só; somos milhares de etnias com a mesma cor de pele. Mas nada disso importa aqui no Rio de Janeiro, pois ainda somos tratados como sequestrados, ou melhor semi-sequestrados, porque ainda nos dão apenas o que é necessário para continuar trabalhando.
Quando estamos cansados ou aflitos, rezamos para o Deus do sequestrador. Não conhecemos ou, se conhecemos, temos vergonha de nossa origem, de nossa pele, de nosso cabelo.
Andamos na rua sem chamar atenção, temos medo de tudo. Somos hipertensos de tantos sustos e humilhações. Temos que ser duas vezes melhores para nos sobressairmos aos descendentes dos sequestradores. E quase nunca conseguimos.
Não há nossa imagem e semelhança nas propagandas, nas peças de teatro. A Cleópatra imortalizada nos cinemas e no inconsciente coletivo mundial é de uma mulher branca.
Somos barrados até no imaginário.
E não queimaremos nada.
E não quebraremos nenhum banco.
E não faremos greve de fome.
E não ficaremos pelados.
Nada.
Apenas seguiremos vivos.