Moradores aguardam fim de tiroteio para entrar na Favela do Jacarezinho durante a noite de 12 de agosto. (Créditos: Reprodução Internet)
Moradores aguardam fim de tiroteio para entrar na Favela do Jacarezinho durante a noite de 12 de agosto. (Créditos: Reprodução Internet)
Moradores aguardam fim de tiroteio para entrar na Favela do Jacarezinho durante a noite de 12 de agosto. (Créditos: Reprodução Internet)

Os últimos cinco dias foram de intenso terror e clima de guerra na favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio de Janeiro. As últimas operações foram justificadas pela busca do assassino do policial da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) Bruno Guimarães Buhler, 36, morto na última sexta-feira. Entretanto, vale lembrar como tudo começou.

Na última sexta, 11, uma mega operação foi realizada no Jacarezinho logo no início da manhã. Assim como todas as outras operações realizadas por aqui nos últimos 30 anos, a justificativa era o (ineficiente) combate ao tráfico de drogas local – importante dizer que estamos falando do comércio varejista, já que helicópteros com drogas em toneladas somente são apreendidos em fazendas de senadores da República – e cumprir mandados de prisão. A operação mobilizou diversas unidades da Polícia Civil, três caveirões e um helicóptero Águia. Em passagem por uma das saídas da favela, contei aproximadamente 23 carros. Um verdadeiro – e costumeiro – espetáculo midiático.

Mesmo com todo esse efetivo, as forças policiais levaram a pior. O policial civil Bruno Guimarães foi atingido no pescoço e veio a óbito. O que se viu depois de uma operação que, em teoria, visava combater o tráfico foi um verdadeiro revanchismo contra tudo e contra todos, com o objetivo de vingar a morte. Isto prolongou a ação até o início da madrugada seguinte e, posteriormente, por todo o final de semana.

No sábado, véspera de dia dos pais, por volta das 17 horas, uma nova e desordenada empreitada se iniciou. A policia invadiu a favela com voos rasantes do Águia, que, segundo diversos moradores, já apareceu atirando para baixo. Pelo chão, de maneira quase simultânea, viaturas policiais e o caveirão também deram entrada no Jacarezinho.

No momento da invasão, uma festa infantil acontecia na localidade conhecida como Pontilhão, com diversos brinquedos infláveis, como futebol de sabão, escorrego e pula-pula. Tudo foi atingido por tiros. A movimentação infantil na área era grande e muitas crianças brincavam desacompanhadas dos pais, afinal, era uma tarde de sábado. Ninguém poderia imaginar uma correria naquela hora e lugar. Muitas crianças acabaram perdidas de seus pais. O desespero e a procura por elas nos grupos das redes sociais eram enormes e davam o tom dramático do momento. Uma menina de cinco anos acabou morta na troca de tiros. Sua vida foi interrompida por mais uma operação policial justificada pela guerra às drogas que, como já cansamos de falar, é uma guerra aos pobres.

 

Horror no fim de semana

A operação de sábado invadiu a madrugada. Diversos moradores que haviam saído da comunidade durante a tarde para um evento na favela da Mangueira, que é perto, só conseguiram retornar às suas casas ao clarear do dia de domingo. E mesmo com a esperança de calmaria em razão do dia dos pais, a data não foi de paz. No início da tarde, a sensação geral era de apreensão e terror, pois a qualquer momento a guerra poderia ser reiniciada – e assim foi. Próximo ao final da tarde, a polícia mais uma vez entrou na favela e os confrontos e trocas de tiros recomeçaram. Assim foi mais um dia infernal na favela do Jacarezinho, tal qual também na segunda, com uma nova operação-revanche.

As ações da polícia do Estado do Rio na periferia são a materialização do ódio de um Estado falido contra a camadas mais baixas da sociedade, os excluídos financeira e socialmente. Não fosse tudo isso suficiente, ainda temos episódios repugnantes como o discurso de ódio do delegado Marcus Amim, um agente do Estado cujo salário é pago com nossos impostos e que faz as vezes de consultor de (in)segurança do SBT Rio. No programa exibido ontem, ele disse ao vivo: “Não vamos parar, vamos entrar sempre. Sábado foi um cartão de visitas, isso vai ser nosso cotidiano. Eu, meus amigos, meus irmãos estaremos lá”.

Além do ódio estampado na cara dessa pessoa, a questão que fica é: o que “vai ser nosso cotidiano”? As ações inúteis e violentas na favela? A morte de crianças vítimas de balas perdidas após operações policiais? Esse cotidiano já é o nosso cotidiano, dr. delegado. Já conhecemos essa rotina. E mesmo com todo o ódio do Estado e de seus agentes, a favela resiste, como sempre resistiu. Favela é sinônimo de resistência.

O saldo, após cinco dias de enfrentamento intenso, são uma criança de 5 anos morta, um policial civil morto, um morador baleado de raspão na cabeça, a impossibilidade de qualquer comemoração de dia dos pais, comércio fechado ou funcionando timidamente de sábado a terça, escolas e creches com aulas suspensas por dois dias, além da angústia por não saber quando essa guerra aos pobres irá acabar. Seguimos contando mortos e prejuízos.