Os desafios da Inclusão social: O caso paradigmático das favelas no Brasil 

Fabio Alves Gomes de Oliveira

Mestrando de Filosofia – UFRJ/PPGF

Núcleo de Inclusão Social – NIS

Este trabalho pretende mostrar uma breve introdução ao problema da definição de exclusão social dissipada nas sociedades atuais e apresentar, de que forma, alguns conceitos em torno de um ideal de sociedade acabaram por minar a lógica de nossos anseios por justiça. Desta forma, a justiça é colocada em questão como um caso paradigmático que nos faz repensar sobre as situações enfrentadas por comunidades carentes de serviços básicos que vivem à margem da dinâmica da produção e de um mundo que se diz globalizado e interligado.

  I

Nesta primeira etapa do trabalho analisarei conceitualmente a definição de exclusão social tentando buscar, para além de uma idéia macroeconômica, elementos que permeiam e invadem a esfera individual, modificando valores e padrões de vida. Ainda assim, não deixarei de salientar o papel importante que os problemas de ordem econômica possuem na preocupação mínima de uma concepção básica de vida digna.

Para começar, me preocupo em desvendar um dos elementos que compõe a mais trivial idéia de percepção e participação social que atinge as comunidades à margem da sociedade, o desamparo. Este sentimento, sem dúvida alguma, se manifesta a partir do papel que o Estado possui ou deixa de possuir perante seus concernidos – o descaso. Isso quer dizer que, em primeira instância, o Estado ocupa um papel elementar e essencial para a própria dinâmica social que ele pretende representar.

O que pretendo levantar é que, em certo sentido, alguns grupos de pessoas de uma sociedade plural e dinâmica ocupam um lugar mais vulnerável, ou seja, são identificados como mais excluídos. Além de nos utilizarmos do critério de renda que, obviamente é um elemento indiscutível para uma avaliação de níveis de exclusão, o próprio sentimento do descaso, anteriormente citado, é percebido pela população como um sentimento legítimo que, por muitas vezes ignorado, deveria ser levado em consideração para uma avaliação mais abrangente do papel do Estado em determinadas localidades e, por conseqüência disto, uma concepção mais participativa da sociedade como um todo.

De fato, a sociedade contemporânea criou mecanismos para burlar o próprio conceito de exclusão, sendo o maior deles, o consumo. A tentativa de conceber a exclusão como um mero surgimento de aspirações e expectativas de consumo frustradas tomou grande força na nova dinâmica social que, inclusive, entranhou esta maneira de conceber os indivíduos como meros aspirantes de padrões neoliberais, na própria relação pessoal que as pessoas passaram a ter uns com os outros.

No entanto, o que devemos ter em mente é que, para se construir um conceito de justiça que responda às expectativas particulares de uma sociedade marcada por sua própria história e, por isso, por dificuldades específicas, deve-se reformular sua compreensão sobre o conceito de exclusão de forma a responder o que isso desvelou na sua própria sociedade. Sendo assim, apesar de vivermos em um mundo globalizado, não somente as questões filosóficas, mas as sociológicas devem influenciar e definir quais anseios básicos serão sanados. Isso acaba por fazer com que a definição da exclusão social seja fruto de uma pesquisa sobre de que forma uma determinada sociedade vive, considerando suas especificidades e necessidades locais.

A partir de agora, me atentarei em avaliar o caso brasileiro, no que diz respeito à exclusão social, mais especificamente no caso das comunidades carentes de serviços sociais básicos.

II

A proposta desta etapa do trabalho é apresentar e justificar a inclusão social como conseqüência imediata de uma concepção moral do que entendemos por justiça. Sendo assim, as favelas, no caso específico do Brasil, são utilizadas como palco paradigmático de uma exclusão não meramente econômica, mais que sofre frequentemente discriminações de outras ordens. Isto significa dizer que, para além do descaso sofrido pelo desamparo do Estado, os moradores das favelas brasileiras, e aqui me atentarei ao Rio de Janeiro, acabam por sofrer diariamente preconceitos enraizados em torno dessas localidades, muitas vezes vista como segmentos que, apesar de participarem de um contexto social abrangente, não são dignos de respeito.

O mundo está passando por uma série de reordenamento social que abrange inúmeras esferas da vida fazendo com que surjam as mais diversas formas de expressões. No caso da exclusão social, isso se reflete em uma multiplicidade de acepções, podendo significar desde estar excluído da possibilidade de garantir a sobrevivência física, até um sentimento subjetivo de ressentimento por não desfrutar de bens, capacidades ou oportunidades que outros indivíduos possuem e desfrutam. Dificuldades de deslocamento e acessibilidade à bens também contribuem para a nova formação da dinâmica social e do aparato que o Estado fornece e deixa de fornecer para as favelas, por exemplo.

Na favela, poderia se dizer que o sentimento de exclusão perpassa inúmeros níveis. No entanto, pretendo levantar que, apesar de se manifestarem em diversas formas, esse sentimento de exclusão é legítimo e deriva de uma mesma fonte. Isso que dizer que poderíamos destacar exemplos específicos de casos onde cidadãos se sentiram e se sentem discriminados por motivos particulares, muito embora todos esses, de alguma forma, partem da falta de uma rede de disposição estatal para proteção e garantia do desenvolvimento das capacidades desses indivíduos.

Nas favelas, indiscutivelmente, a idéia de exclusão se confunde com uma face fundamental, a pobreza. No Brasil, de modo geral, a renda participa de todas as formas de exclusão e em todos os níveis que se desdobra. Entendido como a incapacidade de satisfazer necessidades básicas para que o indivíduo possa desenvolver suas habilidades específicas o Estado não atende às expectativas mais triviais de boa parte da população. E apesar de sabermos que a exclusão ultrapassa a concepção econômica, (por exemplo: exclusão de raça, gênero, idade, orientação sexual etc.) no Brasil, no entanto, ainda possui em seu berço o critério mais fundamental – a se saber, a linha da pobreza. Isto significa dizer que, na favela encontramos o ponto culminante do descaso social Estatal e, além disso, o palco onde identificamos cotidianamente as mais diversas formas de discriminação social. A exclusão, em suas mais diversas formas, participa do dia-a-dia dos moradores dessas localidades que, frequentemente, sofrem com isso. De qualquer forma, chamo atenção para o problema concreto no qual as favelas enfrentam hoje em dia. Apesar de integrar a noção de mundo globalizado, na favela identificamos dificuldades elementares no que diz respeito à assistência de serviços básicos para o desenvolvimento humano e, por isso, necessitam de uma atenção especial e mecanismos legais para sua inclusão e participação social.

Além disso, a inclusão dos moradores da favela deve corresponder as especificidades vivenciadas pelos seus moradores, ou seja, onde os indivíduos daquela realidade possam manifestar integralmente seus anseios específicos e formularem suas próprias demandas. Desta forma, poderíamos conceber a construção de um conceito de justiça que permita a participação social em seus diversos níveis, de forma a corresponder exatamente com as necessidades específicas daquele segmento. Embora difícil, esta é a única forma de conquistar uma sociedade onde se permitam as mais diversas elaborações de boa vida, onde cada um pudesse desenvolver suas capacidades de acordo com suas pretensões e, obviamente, com a premissa de que o desenvolvimento de um não impedisse, de alguma forma, o desenvolvimento de outro participante social. O respeito às diversas formas de expressão e manifestação cultural devem ser possibilitadas para que nosso mundo, de maneira efetiva, possa se dizer um mundo globalizado, interligado e, agora, realmente justo.