Nossa apatia é tão visível quanto uma escandalosa euforia da incapacidade, um carnaval de medo e preguiça, um arsenal mofado de pólvora resmunguenta e murchos canhões brochados. Nossa imobilidade extravagante espanta até os ratos.
Os roedores nos olham e sussurram, e sorriem, e saqueiam tudo a nossa volta. Seus corpos cinzas, velozes no tomar e no evadir. Nem são tantos. Não andam com multidões de ratos estes ratos. São astutos e seus olhares não têm afeto. São olhares puramente táticos.
A polidez de fachada é o brilho de bijuteria do olhar sem encanto destes ratos planaltinos.
Lá vão eles os ratos. Entraram no Palácio e dia a dia confiscam nossos tesouros.
Ratos vaidosos, clicados, expostos. Olhei suas faces. Todos têm cara de rato. São singulares e inconfundíveis de alma.
Os ratos querem agora furtar fios, cabos, lâmpadas. Os ratos já cavaram dutos para desviar petróleo. Vão adorar ficar gosmentos de óleo negro estes ratos.
Estes ratos roem até pequenos salários.
E quando estamos assim, admirando a astúcia dos nossos ratos, eis que… Para além destes ratos tão nossos, tão nossos… Projeta-se a sombra de ratões mais graúdos, ratazanescos, importados, metamorfoseados por outros luxos, poderes e noias.
Nossa pele vibra asco de tanto rato.
E não sabemos sequer como reagir.
Nem são muitos ratos. Mas são mega-ratos.