A vida em risco de ativistas sociais virou tema de debate de diferentes grupos
defensores de direitos humanos no mundo inteiro. Recentemente André Fernandes
teve sua vida ameaçada pela segunda vez, e esta notícia atravessou os canais
oficiais. Foi parar na Irlanda, ocupando hoje a quarta Plataforma de Dublin, que
relata perseguições a defensores dos Direitos Humanos mundo afora. Conforme
noticiou Jan Teophilho em sua coluna do Jornal O Dia. André Fernandes está na
lista dos brasileiros, junto com Valmir de Oliveira, do MST, assassinado mês
passado.

    Como participante desta história, gostaria de compartilhar com vocês os fatos.
Há cerca de quatro meses atrás, no lançamento do site da ANF, conhecemos Ana
Margarida, uma portuguesa em visita ao Brasil, que pesquisava sobre movimentos
sociais. Mantivemos com ela uma relação estreita, que se transformou numa
profunda amizade. A convite de Mauricio Campos, fomos juntos a uma vigília
contra as ações da polícia durante o PAM, no morro do Timbau, promovida pela
Rede de Comunidades e Movimento Contra a Violência. Entre caipirinhas e fartos
gestos de proximidade, nos misturamos aos visitantes, ativistas, moradores,
crianças da localidade e alguns corajosos que toparam encarar a chuva que não
parou um só minuto. Ana Margarida e eu nos assustávamos com a entrada dos
policiais armados que invadiam os cômodos mais íntimos da casa, sem mandato de
busca, ao som do pagode, no meio das crianças e pessoas de idade. Estávamos em
pleno PAM e, segundo os moradores, isto era rotina, um pouco a mais do normal por causa das
atividades do senhor César Maia.

    De volta a Portugal, Ana Margarida continuou desejosa de saber notícias. Logo em
seguida, André Fernandes recebeu a ameaça de morte e iniciamos, por intermédio
dela, o primeiro contato com a Front-line, que nos recebeu com muito interesse,
solicitando-nos mais dados acerca do seu trabalho. Com a ajuda de amigos conseguimos traduzir a trajetória de André, enviando-a juntamente com as
notícias que recebíamos de fora: André viajando por vários Estados do Brasil,
divulgando a ANF. Continua vivo e ativo, como dissemos a ela em várias
oportunidades.

    De posse da trajetória, a Front-line se interessou em participar conosco,
orientando-nos no que fosse necessário. Mostraram-se profundamente indignados
com o fato da imprensa brasileira divulgar seu nome e sua foto em um de seus
jornais, com a informação de que ele estaria sendo ameaçado pelos traficantes
locais, o que não era e nem é verdade, pois a ameaça até hoje não foi
identificada. Esclareceram-nos acerca do fato de que, não somente no Brasil, mas
em outras partes do mundo, a carreira do ativista social tem sido associada ao
tráfico de drogas ou terrorismo, como uma forma de desqualificar o trabalho. Enviaram ainda,
para o Presidente Lula uma carta em que reivindicam apoio pessoal a André
Fernandes, exigindo do governo proteção para sua vida e de seu trabalho.

     Além de todas estas ações voluntárias, nos foi oferecida a escolha do nome de
André Fernandes para fazer parte da lista dos 12 ativistas sociais de todo o
mundo, em um post-card por ela publicado, a ser divulgado em vários lugares.
Ficamos muito honrados de estarmos fazendo parte deste momento da história,
onde um ativista social recebe apoio de amigos e sociedades internacionais,
conseguindo sobreviver às ameaças, mantendo-se vivo em meio a intempéries e
dificuldades. Sabemos que isto não é o suficiente, é apenas o mínimo que
pudemos fazer, de forma conjunta, para dar-lhe a merecida dignidade. Desejamos
que este seja apenas o primeiro passo de uma longa e feliz caminhada. Para
todos aqueles que acreditam na luta e na força conjunta, que depende de todos e
não somente dos que se colocam à frente, tornando-se alvejados.

      Eliane Martins é psicanalista