Hoje me deparo com certas questões pertinentes a qual me proponho a relatar pois, acho de interesse público, não poderia me aquietar diante de tantas opiniões medíocres e egoístas que carecem de sentimentos, de compaixão e conhecimento erudito, sendo mais explícito.
O conceito de família que conhecemos hoje, parece, antes de tudo, que sempre tratou-se de um conceito fixo, imutável e, que seu significado nunca antes fora diferente. Engana-se aqueles que creem que o conceito de família sempre foi o mesmo.
Com base em estudos históricos podemos conferir tal questão e, elucidar a mente daqueles que carecem de conhecimento, talvez por falta de acesso, talvez por falta de vontade ou talvez por mau-caratismo.
Ao longo da história do homem e da formação das sociedades, modelos diversos de família se desenvolveram em todas as regiões do globo terrestre.
Divididos em culturas desiguais, a ideia de família nunca foi o mesmo, nem mesmo em um único povo. O que quero dizer é que mesmo na formação de uma sociedade como a brasileira, a ideia de família foi mutável de acordo com a vontade do homem e a realidade do momento por qual se encontravam os seres humanos.
Na formação do estado brasileiro, durante o período colonial leis foram impostas pela coroa e reforçadas pelos jesuítas com o intuito de garantir a formação da colônia. Só era possível ter direito a terras, por exemplo, caso possuísse família. Políticas de povoamento como o envio de mulheres solteiras para a América Portuguesa foram uma destas medidas a fim de garantir a formação de um povo.
Com base em conceitos religiosos, jesuítas conseguiam mais que ninguém incentivar aos homens solteiros que buscassem formar famílias em terras novas para assim conseguir sua benção e garantir seus direitos cívicos. Porém, não foi uma tarefa fácil. Muitos portugueses encantados com a vida indígena, abandonavam seus costumes do antigo continente e lançavam-se na nova vida encontrada no novo continente, e isso não era restrito aos homens. Registro de mulheres portuguesas que também se identificavam com a vida indígena acabavam por romper com seus costumes e abandonavam seus vilarejos para viver como e junto aos índios.
Sem o aprofundamento histórico pois essa não é a ideia central do texto, o significado de família para os séculos passados em terras de América Portuguesa, baseava-se, não no conceito de consanguinidade, mas sim de um pacto social, portanto, família eram pais e filhos, bastardos ou não, parantes de segundo e terceiro grau, além de escravos e agregados do patriarca.
Não vale aqui relatar também como funcionava a ideia de família para os indígenas e outros povos da antiguidade, como os gregos por exemplo, esses nós sabemos que fogem a qualquer regra que hoje vigora em nossa sociedade.
O próprio significa da palavra família tem origem sem ligação com a definição de hoje. Família para a história, remontando sua origem “famulus”, significa escravo, ou um grupo de pessoas sujeitas ao paterfamilias. Mas isso, é outra história.
Pertinentemente ao texto, o desejo de introduzir a questão do significado e mutabilidade do conceito de família, vem das ultimas discussões no congresso nacional referente a PL 6583, de 2013, conhecido como o “Estatuto da Família” do deputado Anderson Ferreira (PR-PE) da bancada evangélica.
O texto deste projeto de lei em sua íntegra diz que: “Para os fins desta lei, define-se entidade família como núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais ou seus descendentes.”
Antes de tudo, isso significa que casais homossexuais hoje, seja ele constituído por dois homens ou duas mulheres, com seus filhos adotados, não poderão ser considerados uma família. Esta PL desenterrada pelo senhor Eduardo Cunha (PMDB-RJ) hoje presidente da câmara federal, é uma ameaça a mutabilidade do conceito de família e a diversidade humana.
Com um projeto de lei fascista que visa impor limites ao que se entende por família, buscam estes congressista estipular que o modelo ideal de ser humano deve ser baseado em conceitos religiosos ferindo completamente a laicidade do estado, o qual quanto república, deve garantir o direito e a liberdade de todos e não da maioria ou de alguns.
O princípio da isonomia antes de tudo, precisa hoje, mais do que nunca, trazer questões atuais para dentro do direito, a fim de garantir a igualdade de tratamento para os iguais e o diferenciado para os desiguais a medida em que estes se desigualam.
Temos a necessidade de hoje, reconhecermos que a diversidade faz parte da natureza humana, e isso deve ser defendido por juristas a qualquer custo e, que projetos de lei como estes, que visam delimitar o alcance a garantia de direitos a diversidade, não passem jamais.
Sendo pragmático e partindo para questões cotidianas, tenho amigos homossexuais e pessoas próximas, até mesmo familiares os quais eu amo de coração e não pensaria duas vezes em arregaçar as mangas e lutar pela garantia de seus direitos.
Do que chamaríamos um casal de dois homens com um menino adotado se não de família ? Seriam um bando ? Como classificaríamos duas mulheres com uma menina adotada ? Um aglomerado ? Um grupo ? Um trio ?
Essas questões precisam estar dentro do nosso debate cotidiano a fim de garantir que o direito a diversidade seja de fato garantido. E que o conceito de família, não seja fixo como desejam alguns parlamentares principalmente religiosos cristãos. Que o conceito de família seja o mesmo adotado hoje para as crianças em processo de adoção, que leva em consideração não consanguinidade mas sim a identificação entre os relacionados, assegurando desta maneira que família, não se trata de sangue apenas, mas também de afetividade. Como no passado, o sentido de família muda, e que as mudanças e o direito, sempre acompanhem as necessidades da sociedade.
Referências:
FARIA, S. S. C. . A Colônia em Movimento, Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. v. 1.
SILVEIRA BUENO, Francisco. Minidicionário da Língua Portuguesa. 3ª ed. São Paulo: Editora Lisa S.A, 1989. p. 288.
SILVA, Maria Beatriz Nizza da. História da família no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.