Existe algo pior do que pagar Imposto de Renda? A resposta não é unânime, mas, para mim, existe: preencher os formulários, obrigação que eu e a torcida do Corinthians, do Flamengo, além dos que odeiam futebol fazemos sempre, na última hora do último dia. Escrevi obrigação, mas é tortura.
O preenchimento parece menos absurdo do que o pagamento? Isso depende do quanto custa sua paciência. A minha, agravada pelos tropeços da vida, não tem preço.
Sonho com o dia em que receberei o boleto com o resultado da declaração. Não precisaria nem anexar as planilhas de detalhamento. Eu ficaria tão feliz que nem conferiria as contas – assim como, em geral, não confiro quase nenhuma.
Mas, para quem quisesse conferir, e já que a Receita Federal teria feito as contas, o contribuinte poderia receber o arquivo com todos os dados em PDF, Excel ou em qualquer outro formato.
A proposta parece absurda? Talvez não seja. Pensa comigo: a Receita Federal dispõe dos nossos dados, certo? Tanto dispõe que, por qualquer vacilo, somos flagrados na malha fina. Portanto, meu Deus, qual a dificuldade em pedir para alguma inteligência artificial fazer o trabalho de contagem, subtração, divisão e multiplicação da nossa vida financeira? Ou seria fiscal?
Você ainda pode estar achando a proposta absurda, mas ela vai se tornando cada vez mais aceitável na medida em que entendemos que as máquinas devem trabalhar para nós, não o contrário.
Em um livro badalado lançado em 2000, desses que você encontra até em posto de gasolina de beira da estrada, o sociólogo italiano Domenico de Masi defende a noção de “ócio criativo”, que não significa vagabundear, mas aproveitar criativamente o tempo.
Porém, como realizar essa utópica proposta, meu querido de Masi, se no melhor momento do relaxamento criativo você tem que pular do sofá, no final do domingo, porque lembrou que não preencheu o maldito Imposto de Renda, e o prazo se encerra em poucas horas?
E não me venham com essa pseudo-facilitação de que, caso preencha errado a declaração, é possível fazer a famigerada retificação. É um segundo preenchimento, só o adiamento do problema, e pior: precisa ser exato, corretíssimo, para que não gere a retificação da retificação, um espiral infinito de loucura, tortura, talvez de morte.
O envio do Imposto de Renda preenchido ao contribuinte teria vantagens também para essa gracinha de governo que nos abocanha como um leão: diminuiria o ódio ao imposto, uma vez que geraria menos estresse. Já imaginou, por exemplo, receber automaticamente a restituição, caso tenha direito?
Devo confessar que se, tecnicamente falando, nada disso for possível, será a maior decepção tecnológica da minha vida. Corro o risco de passar a desconfiar, como os negacionistas, de que o homem foi à lua.
Marcos Zibordi
@mzibordi
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