Foto cortesia de http://www.paebiru.com
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O projeto independente Domínio Público, que investiga para onde estão indo os bilhões de Reais supostamente investidos na realização da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas em 2016, pode perder todos os seus recursos se não alcançar o seu objetivo de arrecadar 90 mil reais até o dia 16 de novembro próximo.

O material coletado pelos cineastas Fausto Mota, Henrique Ligeiro e Raoni Vidal foi resultado de entrevistas com moradores das favelas de Vidigal, Vila Autódromo e Providencia e conversas com experts sobre o assunto como Marcelo Freixo, Romário e o professor Carlos Vainer.

Domínio Público, produzida por Paêbirú Realizações Cultivadas (fundada pelos criadores do projeto há dois anos), já foi postado na internet em forma de curta-metragem, mas seus criadores querem dar o próximo passo e transformar o projeto em um documentario de longa-metragem que permitiria uma investigação maior do assunto e chamaria mais atenção.

– Quando iniciamos a pesquisa, a gente começou a se perguntar o porque das UPP’s  terem sido implantadas em algumas favelas específicas, em alguns lugares, e não em outros ? Por  que isso só acontecia na Zona Sul e principalmente no entorno do Maracanã ? E a gente começou a indagar, porque isso? Qual o interesse por trás dessas UPPs nesses lugares? Começamos a pesquisar e percebemos logo que as UPP’s  eram financiadas por Eike Batista, pela Coca Cola e pela CBF. – explica Fausto Mota, produtor e diretor do curta-metragem.

– Essa constatação nos preocupou mais ainda. Qual seria o real interesse de por trás das doações de Eike Batista para as UPP’s?  Fomos às comunidades e logo começamos  a notar um problema muito sério como consequencia das obras que são as remoções de pessoas e até de comunidades inteiras. Nossa conclusão é que o que está acontecendo é uma limpeza social da cidade, falando bem claro.

Foi estimado pelos criadores do projeto que 35 mil pessoas já foram ilegalmente removidas de suas casas para dar espaço para construções imobiliárias e outros investimentos que não beneficiariam os cidadãos das comunidades afetadas, mas sim grandes empresas.

– O mapa das UPPs no Rio de Janeiro é muito claro – explica o deputado estadual  Marcelo Freixo no curta-metragem. – Elas estão na Zona Sul onde está a rede hoteleira, no Morro da Providencia em função do Porto Maravilha, no entorno do Maracanã e na Cidade de Deus, que é o único lugar em Jacarepaguá que não é tomado por milícias. O mapa das UPPs é revelador de um projeto de cidade onde há uma retomada militar de territórios para viabilizar uma cidade-investimento, uma cidade-empresa.

– Quando as pessoas assistem o curta metragem, elas chegam até a ficar chocadas – diz Fausto, que também afirma que a recepção do curta tem sido boa. – Mas é complicado porque as pessoas que mais precisam de informação não tem acesso a internet e ainda são excluídos digitalmente.

Cine ataque. Foto cortesia de http://www.paebiru.com

Na tentativa de aliviar este problema, a produtora Paêbirú Realizações Cultivadas organiza eventos chamados Cine Ataque que consiste na exibição deste documentário com um simples projetor e uma tela montados em espaços abertos nas próprias favelas.

Dos R$90 mil necessários, o curta divulgado já arrecadou por volta de R$60 mil. Se o objetivo final não for alcançado o dinheiro já arrecadado será perdido por causa do sistema “tudo ou nada” usado pelo site Catarse.

O curta tem entrevistas com os deputados Marcelo Freixo e Romário e o professor Carlos Vainer, um  especialista no assunto de obras da Copa do Mundo. Mas o impacto real do vídeo vem das entrevistas com os moradores que até hoje estão lutando pelas suas comunidades.

Ney Ferreira, morador do Morro da Providencia e membro da comissão de residentes em defesa da moradia, conta que a construção do teleférico em sua comunidade não trará nenhum benefício aos moradores e que o prejuízo está sendo grande. Para construir a base do teleférico, a praça Américo Brums foi destruída e esta era o único lugar disponível para o lazer das crianças da favela e 2000 pessoas foram ameaçadas de remoção.

– Meu relato (para o documentário) foi o seguinte: teleférico para quem? Para nós moradores, não é. A obra comete um paradoxo grande, o teleférico não atinge nem o lugar mais alto do morro – revela Ney. – Destruíram uma praça que criancas brincavam. Era o unico lugar para lazer. Prometaram que iam fazer centro esportivo e até agora nada. Um ano e pouco de obra só dá obra de teleférico e as demolições.

Ney explica também que o teleférico partirá da Central do Brasil, sobe até o Barroso, aonde ficava a praça que foi destruída, e depois vai direto para a Cidade do Samba e adiciona que moradores não terão nenhum uso prático para o novo meio de transporte.

As ameaças de remoção vieram em grande parte porque laudos do governo acusaram perigo de deslize – mas ao chamar o engenheiro Maurício Campos e arquiteto Marcos Azevedo foi comprovado que somente duas moradias estavam em risco. Agora, o número de remoções será de 832 mas somente 60 novas moradias serão construídas.

Fausto Mota conclue que o bem estar do cidadão não é prioridade em relação as obras para os eventos esportivos.

– Objetivo não é mais o interesse do cidadão, o bem estar do cidadao. O governo virou um banco de negócios e esses empresários vão dar os seus lances, fazer seus investimentos, e quando se trata de negócio o que importa é tirar o lucro máximo. Se o lucro máximo é tirado de remover pessoas dali e construir um resort, é isso que vai ser feito.

Foto cortesia de http://www.paebiru.com.

Também é mostrado no curta metragem que muitos residentes das favelas afetadas pelas obras não tiveram escolha e tiveram que sair de suas próprias casas. Uma imagem que marca é a de Dona Graça, da Zona Portuária contando que entraram homens na sua casa e destruiram seus pertences.

– Era visível que essas pessoas estavam muito emocionadas, segurando o choro. – revelou Fausto sobre as entrevistas com os moradores. – Elas estavam muito indignadas com a maneira que foram tratadas.

A situação foi advertida pela ONU como desumana no passado, mas até agora ninguém foi punido e os habitantes das favelas continuam sendo removidos.

– Nos direitos humanos, para remover uma pessoa da sua casa, essa pessoa precisa de uma chave pra ir para outra casa. – diz Romário para a camera. – E o que está acontecendo em relação à isso é a remoção dessas pessoas de uma maneira desumana, ilegal e fora da constituição. A própria ONU já declarou isso e as pessoas continuam passando impunes, infelizmente.

Doações serão aceitas até dia 16 de novembro pelo site www.catarse.me/pt/dominiopublico. Se o objetivo não for alcançado, o dinheiro voltará para os doadores e a voz do povo carioca não será ouvido.