Crédito: Bruno Dias

É em uma rua estreita da favela do Heliópolis que Rubenildo Limeira de Souza, educador social, luta pelos seus sonhos de educar, informar e transformar. Todos os dias, por 3 anos, às 12 horas, passa pelo portão da pequena casa que abriga a Rádio Comunitária Heliópolis, olha para o topo da torre de transmissão, senta-se próximo à mesa de som e cumpre mais um dia de locutor que vê na resistência política, o caminho para a construção de um mundo mais igualitário, justo e para todos. “A rádio existe para empoderamento das pessoas. É uma forma de dizer para elas que todos têm o direito de alcançar os seus sonhos. A Rádio Comunitária Heliópolis existe para manter a esperança”, diz.

A luta por um mundo fraterno que contemple as vozes dos desfavorecidos, tem seu preço. Rubenildo é voluntário, trabalha por amor, e diz que os apoios que o projeto recebe, são apenas para manter a estrutura.

– Também tem a luta para a comunidade entender o nosso propósito. As vezes nós fazemos um trabalho imenso de conscientização e vemos as pessoas tomando decisões de ‘serrar o próprio galho que está sentada’, votando de forma errônea em quem só olha para o lado dos poderosos que não enxergam o social, ou em quem distorce os direitos humanos. O direito humano é o direito à vida e não o direito de quem faz coisa errada.

Sobre a mídia tradicional, o locutor, filósofo e sonhador Rubenildo também é crítico. Diz que os meios de comunicação tradicionais, por mais que as vezes retratem as favelas, estão voltados ao lucro dos anunciantes e por isso, não falam dos reais problemas da população.

Crédito: Bruno Dias
Crédito: Bruno Dias

No pequeno estúdio, local de grandes ideias, semente de grandes transformações, em seu programa diário, Rubenildo preocupa-se em dar voz. Além de orientar sobre política e questões do Heliópolis, dá visibilidade a artistas como ele.

– A rádio é aberta para todos, sem restrições, com foco no bairro educador.  Aqui as pessoas podem mostrar sua arte e lutar pelo seu sonho. Muitos dos que vem aqui seriam explorados ou extorquidos aí fora na hora de mostrarem sua arte. Aqui não. Aqui há espaço para músicas regionais, procura de desaparecidos, para o pessoal da umbanda e do candomblé. Aqui queremos que toda a vivência comunitária seja possível,

O jovem locutor, jornalista, artista, escritor e sonhador, orgulha-se do que faz; sente-se bem em ser a voz de uma rádio com história. Embora não tenha vivido essa época, comenta o tempo que a transmissão foi proibida pela polícia, com a acusação de roubar sinais de rádios famosas e atrapalhar a comunicação dos aviões.  “Lula quando foi Presidente interviu, regulamentou a Rádio Comunitária e quando veio nos entregar a chave, disse: Falem mal do meu governo, mas falem bem de vocês. Nunca mais alguém vai fechar essa rádio”

Sobre o momento político do país, acredita que o Brasil vive em um golpe de Estado com viés psicológico e com poder de convencimento da população. “Lula quando chegou à presidência nos deu esperança. Passamos a achar possível que os pobres e os nordestinos podiam chegar lá e mudar a vida das pessoas. Isso mexeu com o ego de muita gente. Tem muita gente que não admitiu essa mudança”. Ao término da entrevista, reitera sua importância de trabalhar para a conscientização das pessoas: “Não podemos deixar que a comunidade bata palma para fascistas”

Resistência

Crédito: Bruno Dias
Crédito: Bruno Dias

Ali naquela pequena rua que armazena sonhos imensos, também há outro amante de um mundo melhor. O senhor Renato Rodrigues dos Santos, há mais de 15 anos dedica-se ao sonho de transformar a coletividade. Desde 1998, assim que se aposentou, usa a imensa torre de transmissão para, em seu programa, plantar as sementes de transformação do mundo. “Eu sou um ex-metalúrgico e assim que me aposentei, para não pensar besteira, passei a me envolver com a rádio. Não tinha experiência nenhuma, mas aprendi tanto que fui convidado pela Unas (União de Núcleos, Associações dos Moradores do Heliópolis e região) para ser o editor. Fiquei até emocionado”, diz.

Seus programas ocorrem no horário da manhã, mas sua ajuda não se limita a programação. Sr. Renato ajuda os 22 locutores de dentro da comunidade, a dar voz aos 40 mil habitantes que nela mora. “Ainda assim, nossa dificuldade são os voluntários. Temos dificuldades de preencher a programação durante o dia porque as pessoas trabalham”

Entre os momentos mais emocionantes que viveu nessa experiência, lembra do dia em que o papagaio de uma moradora sumiu. “A moradora desesperada veio pedir ajuda para encontrar o papagaio. Fizemos uma grande mobilização na programação, até que uma ouvinte da Estrada das Lágrimas nos ligou dizendo que havia encontrado. Fui buscar e devolvi a ave para a dona. Foi emocionante. A gente que tem animal sabe o que isso significa”, termina.

Crédito: Bruno Dias
Crédito: Bruno Dias

Dona Maria Geralda, ouvinte, questionada sobre o que acha da programação, diz: “Muito bonito, meu filho, muito bonito”. Emocionada, após ouvir as sanfonas do Manoelzinho do Acordeon tocar “Asa Branca” de Luiz Gonzaga, se lembra do Piauí, lugar onde nasceu. “Fico emocionada. Lembro da terrinha”, conclui.