Sempre ouvi dizer que o Rio era uma cidade muito boa para se viver – o Brasil de um modo geral. Estamos longe de terremotos, ataques terroristas, acidentes calamitosos e fatais. Desastres naturais não existem. Esta é a terra de encantos mil. Mas, depois que se toma consciência de casos como o de Rafael Braga, condenado esta semana a 11 anos de prisão, acaba-se por acreditar que a tragédia natural por aqui é o sistema penal brasileiro. O desastre é naturalizado. O navio negreiro continua trazendo inocentes, muito próximos do 13 de Maio em que disseram, há alguns anos, estar abolida a injustiça. Presentes dos gregos.
Nessa escravatura, não há espaço para impunidade. Pelo contrário, há tantas culpas, incontáveis, que nem pertencem aos tripulantes – forjadas para comprovar o que cotidianamente é alimentado: todas as armas e sentenças estão apontadas para jovens negros. Não importa se deve: é pagar e perder. Perder na luta, no trabalho, na justiça, na sentença.
Rafael foi o único condenado nas jornadas de Junho de 2013, sem protestar nem quebrar qualquer palito de dente. Ele não é o único mártir: houve dois em Nova Brasília no mesmo dia. O Estado e a Justiça são racistas institucionais. Não há delação premiada, selfie no aeroporto nem jantar com Sérgio Moro; a bala determina e nunca falha. Sempre falha. E a injustiça? O flagrante manipulado? Um morador de rua ignorado e com privação de liberdade, por uma decisão tal qual o resultado de “bem-me-quer” ou “mal-me-quer”. Os privilégios brancos se firmam atrás de sobrenomes estrangeiros de empresas famosas, da exploração, abuso a domicílios, do genocídio do povo pobre, negro e favelado.
Preto bom é preto morto, sem perspectiva e esperança. Quer desastre “natural” pior que esse?