A primeira vez em que fui assaltado foi em Vila Isabel, onde morei por alguns anos. Aconteceu em plena luz do dia. Eu era adolescente, cara de bobo, estava com um relógio. Chegou um cara por trás, segurou meu braço e o tirou de mim. Foi a primeira vez na vida em que senti algo bem estranho: ele não tinha o direito de fazer isso. O relógio era meu. Meu avô tinha trabalhado duro para comprar, e alguém veio para se apossar de algo que não lhe pertencia, de um bem pelo qual não fez esforço algum para comprar.
Na segunda vez, minha mãe tinha colocado um anúncio nos classificados para vender um tapete que meu avô tinha trazido de Bagdá. Também era adolescente e estava com meu padastro em casa, em um final de tarde. O porteiro anunciou o possível comprador. Ao abrir a porta, já senti um clima estranho, até porque eram duas pessoas. Em poucos segundos, um deles puxou um revólver calibre 38 e anunciou o assalto. Houve muito terror psicológico. Amarraram meu padastro e eu. Fizeram a limpa no apartamento.
O tempo foi passando… Trabalhei muito com os menos favorecidos no início da minha juventude, me tornei fuzileiro naval, fui viver mais de perto a realidade das favelas. Ganhei sagacidade para entender os sinais que me permitiram evitar diversos assaltos. Furtos foram inúmeros – em blocos de Carnaval, quem nunca? Mas, assalto, com emprego de força ou arma, foram bem poucos.
Mas sempre pode acontecer. Na terceira vez, eu havia feito um saque no banco para o pagamento de colaboradores de um projeto que temos nas favelas do Rio até hoje. Chegava em frente à vila onde ficava a antiga sede da Agência de Notícias das Favelas e fui abordado por uma moto. O passageiro do banco do carona desembarcou com um revólver 38 e apontou para mim, pedindo o dinheiro e também meu celular. Passei sem hesitar. Só restou, mais uma vez, a sensação de impotência. O boletim de ocorrência na delegacia mais próxima não deu em nada e só serviu para aumentar as estatísticas de violência da cidade.
A ocasião mais recente foi na quarta, quando eu saía do apartamento onde estava editando o documentário “Eu só quero é ser feliz – Uma breve história do Funk Carioca”, que vamos lançar na próximo semana. Saí do portão do prédio onde estava, com meu celular na mão, à espera do motorista do Uber. Em poucos segundos, dois caras em uma moto pararam na minha frente. O carona, com a arma no colo, disse: “Me dá o celular, senão, tu morre!”. Dei o celular, e ele continuou: “Aliança e cordão!”. Mostrei que não tinha nada. O da frente já disse: “Dá logo um tiro na cara dele!” – passou um filme na minha cabeça, com as tantas matérias que vemos na mídia sobre assaltantes desesperados ou mesmo muito frios que disparam contra a vítima. O de trás disse: “A carteira!”. Dei na hora, mais uma vez, sem hesitar.
Novamente, vivenciei a velha sensação de impotência. Fiquei pensando no quanto já visitei presídios, nos quantos marginais que já conheci e no quanto fiz para resgatá-los. Confesso que fiquei com muita raiva, mas também aliviado, porque, como dizem, “Vão-se os anéis, ficam os dedos”. No calor da hora, a vontade era fazer alguma coisa. Ouvi até de alguém: “Esses assaltantes têm que morrer!”. Mas… Olho por olho e o mundo acabará cego.
É impossível não pensar na situação da criminalidade no Rio. Do meu ponto de vista, tudo só tende a piorar com a recessão e o desemprego que vivemos. A solução? Investimento em educação e distribuição de renda em nosso país. Não muda agora, mas essa é a saída. Enquanto houver poucos com muito e a maioria com quase nada, esse e outros muitos casos de violência vão seguir acontecendo.
O que resta é estar atento e forte nas ruas da Cidade Maravilhosa.