No domingo, dia 22/09/2015, em algumas praias do Rio de Janeiro, banhistas sofreram com a onda de arrastões. Jovens das classes populares tocaram o terror nas praias fazendo roubos e provocando muita confusão. Após o domingo quente, as autoridades policiais se manifestaram nas mídias. O secretário de segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, em entrevista ao Jornal Hoje afirmou: “Nós estávamos fazendo um trabalho preventivo de parar e revistar jovens a caminho da praia. Nunca vi isso! Em qualquer país do mundo a polícia faz esse trabalho sem mais problemas, só aqui no Brasil é que é assim.”
Beltrame só esqueceu de dizer que as incursões feitas pelos policiais aos ônibus no Rio de Janeiro não eram apenas de abordagem e revista. Eles retiravam os menores dos ônibus sob critérios que somente a polícia conhece, algemavam e os levavam para a delegacia, sem que os mesmos tivessem portando flagrantes ou cometido algum delito. No entanto, o que ele chama de uma ação preventiva fere a Constituição Federal, pois consta no art.5º inciso XV que Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza e ainda garante a livre locomoção no território nacional, ou seja, é garantido por lei o direito de ir e vir. Assim, a ação dos policiais se caracteriza evidentemente como uma ação ilegal, salvo se estivéssemos em guerra. A fala do Secretário Beltrame se justificaria se esse fosse o caso (ou será que estamos?).
Caro leitor, não sou a favor da violência cometida pelos menores, tampouco sou a favor da impunidade. Sou tão cidadã desta cidade quanto você e sofro com o estado de violência e insegurança que nos encontramos. Mas legitimar uma ação ilegal, com a justificativa que a execução desta poderá, hipoteticamente, impedir que outra ação ilegal aconteça, é impedir um crime com outro. Então, por que não jogamos uma bomba nas favelas e explodimos logo todos esses que se encontram à margem da sociedade e que insistem em nos “incomodar” em nosso lindo domingo de sol? Vamos exterminar todos porque um dia, não tão distante, poderão jogar em nossa cara, além de areia, que essa sociedade de democrática e justa não tem nada.
A solução é simples?
Matamos o mal pela raiz? Encarceramos todos esses deliquentes, reduzimos a maioridade penal e construímos um grande muro separando a elite da classe popular? Fazemos isso ou nos perguntamos: quem são esses menores infratores? “Coincidentemente”, caro leitor, são em sua grande maioria negros, pobres e favelados, herança do nosso país colonial e escravocrata.
Será que os governantes não veem que a praia é um dos poucos pontos de lazer gratuitos no estado e impedir que a classe popular vá a praia só aumenta o vapor na “panela de pressão” que é o atual estado do Rio de Janeiro. E se a (re)pressão aumenta, apenas legitimamos a segregação racial. Ops, não temos segregação racial no Brasil. Ou será que temos?
Ah, sei que você, já deve estar revoltadíssimo com todas essas linhas, afinal de contas, não é justo roubarem nosso smartphone, conquistado com o fruto do suor do nosso trabalho, não é mesmo? Dessa maneira, vamos aplaudir os rapazes brancos da zona sul que heroicamente quebraram os vidros dos ônibus e surraram os meninos negros favelados, arrancando-lhes a socos e pontapés dos coletivos.
Se a polícia e nós cidadãos continuarmos agindo por conta própria sem respeitar as leis máximas de nossa nação e da vida humana, se não refletirmos a respeito dos caminhos que temos tomado como sociedade, até o presente momento, e seguirmos ratificando as ações ilegais dos representantes do governo, e daqueles que fazem justiça com as próprias mãos, onde iremos chegar? Como diz Robespierre, voltaremos ao estado de natureza e o caos se instalará entre nós.
A expressão “o homem que é lobo do homem” (Hobbes) traduz o estado das coisas que estamos vivendo ─ fazendo o que for necessário para proteger e garantir a nossa propriedade, tomando decisões individualistas, estamos nos desumanizando. De acordo com Freire, grande educador brasileiro, se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.
Autoras: Elaine Rusenhack (Pedagoga) e Rita Campos (professora de Português).