Sábado de muito sol e estávamos em clima samba logo muito cedo, na quadra do Unidos do Jacarezinho. Juntamos a galera do “Elo do Samba” e fazíamos algumas gravações do nosso Barbeirinho do Jacarezinho dentro da escola. Sabíamos todos que a barriga podia começar a doer a vontade que em breve estaríamos todos na inauguração do Bar do Rumba, onde era prometido um angu sem nenhum caroço. O problema é que o Jacaré é uma perdição de camaradagem e chegar do outro lado da favela pode custar muitas paradas em muitos bares nas rodas de conversas. Não deu outra! Acabávamos de fazer várias gravações e íamos numa longa caminhada em direção ao encontro marcado. A caminhada, como era de ser esperada, virou uma maratona de boteco em boteco e em determinado momento estávamos na quinta parada obrigatória, no meio da favela, e nada de angu. A barriga doía de fome no meio de tantas cervejas e conversas sem fim quando finalmente chegamos e começamos a comemorar a inauguração do bar mais fantástico da segunda maior favela da América Latina.

            O Bar do Rumba nos presenteou com um “Angu do Jacaré” que acalmou os espíritos da fome. Melhor ainda era o acompanhamento musical. Esse bar era o único, na favela com certeza, e talvez em todo o Rio de Janeiro, que tocava as músicas que brindaram o movimento estudantil e operário contra a ditadura militar. Para mim soava como uma sinfonia inédita no meio daquele cenário, para o Rumba talvez apenas mais um dia de relaxamento e alegria. Não é por acaso que o evento era uma grande homenagem ao Carlos Lamarca. Montamos mais uma vez os instrumentos e a nossa roda de samba mostrou mais uma vez que o Jacaré não deve nada a ninguém, seja nas inúmeras composições maravilhosas ou na qualidade impecável de seus históricos e atuais compositores. A atmosfera do Jacaré, de um verdadeiro celeiro de bambas, contagia e faz com que todos cantem, toquem ou rabisquem alguns versos, mas ficar parado é impossível.

httpv://www.youtube.com/watch?v=yqSYcUduaQ0

            Sei que entramos na quadra do Jacaré ainda pela manhã e no início da noite saímos da fantástica inauguração do bar pegando o caminho inverso do que chegamos. Despedimos-nos dos nossos amigos do “Elo do Samba”, que partiam para um show, enquanto nós fazíamos mais umas três paradas obrigatórias com direito a um incrível solo do Dr. da Cuíca. Chegávamos numa determinada encruzilhada de vielas onde se agrupavam, sem nenhum exagero, os melhores músicos do Jacaré. Parecia uma convenção de Velha Guarda que organizava paulatinamente uma grande roda de samba, da qual obviamente nos incorporamos de corpo e alma. Era a galera do “Bunda Rachada” que quando começou a tocar tive certeza absoluta que estava no lugar certo na hora certa.

            Ficamos por lá ainda até pelas tantas esquecendo completamente a hora e a vida, numa sintonia perfeita de som e musica que impedia todos de irem embora. Lá já não era possível fazer nenhuma gravação, pois simplesmente nossos instrumentos não permitiam.