Ontem cheguei no Santa Marta 6 e meia para ouvir o barulho da banda Na Sala do Sino. Lá embaixo, na praça, vi um cardume de belas moças bebendo cerveja no isopor do camelô. Cheirosas e preparadas para a night. Cheguei a cogitar a hipótese de que o grupo pretendesse o mesmo evento que eu. Subi um pouquinho o morro e soube que o show era as nove. Bom,aproveito para tentar (re)conhecer a comunidade “pacificada”(com todas as aspas possíveis – um dia antes a Polícia Federal roubava o transmissor da rádio comunitária autorizada pela Prefeitura). Fui até o ponto do teleférico e apreciei a vista da enorme fila de turistas e nativos para subir de bonde. Mas a correnteza das preparadas, o fluxo de estrangeiros ao lugar, levou-me em direção a quadra da escola de samba. A rua em frente, tomada de gente. Muita Gente. Pessoas muito parecidas umas com as outras. Estranho. Senti-me um estrangeiro dentro de um grupo de estrangeiros estranhos. Era outro evento no morro. Um show de pagode na quadra. Os rapazes: fortinhos de academia e blusas curtas; as moças lindas, patricinhas repetidas, pareciam de cerâmica. “Bochechinha rosa e cabelo que voa”. Todos enfrentavam enorme fila para conseguirem o idêntico bracelete verde florescente. O morro tá bombando de eventos. A igreja está liberada. O baile está proibido. O morro está ficando perigoso –pensei. Fiquei receoso de pisar no pé de um bombado bêbado prestes a explodir seu ódio irracional; ou sem querer cruzar o olhar com a namorada de um pit-boy.
Ah é, comecei a escrever para falar da surpresa, quer dizer, da música, digo, do espetáculo que participei. Há muito já paquerava isoladamente mas ontem conheci o coletivo. Na Sala do Sino surpreendeu-me. Em Cena. Já havia escutado músicas, lido poemas, assistido vídeos. A boa arte não acontece assim tão simples tipo vídeo ou cd. Escuta o cd, dá uma idéia: tipo de música, tecnicamente, proposta da banda. A gente entende. Entender é bom mas é pouco. Saber é sentir o sabor. É no momento oportúnico que a Arte se manifesta. Ela é a Festa! Esquenta o público com a vibração. A guitarra feroz constrói e destrói. Escreve de giz, apaga, escreve outra coisa. Do baião ao rocknroll com sutileza. Naturalidade de quem engole a caça e bebe ácido-híbrido. Antropocomida.
Na Sala do Sino no palco. Digo, Em Cena. Vivendo a íntegra. Entregando tudo. Entorpecendo o ritmo. Mudando o cabo. Combinando o som como se respira: sem pensar no combinado. Inspirando poesia. Incrementando Ratos.
Missão: o inter-dito. Desinterditar o diálogo. Trocar de igual para igual. Cada um com seu cada qual. Cada qual com seus para ondes. Trocando. Não é doação, é troca. Clamando o toque. Lembrando que arte arde. Tocando. Mexe na ferida. O baile funk proibido. Só o tecladinho. O pagode-pulseirinha cheio de playboy e patricinha.A Leitura. O salário. O baixo. Chegou a cidadania. Vão ter que pagar água e luz. Baterabaterateratera. Ainda não tem água mas já tem que ir pagando. Poesia. Olha que beleza: o valor do imóvel triplicou! Gooooool!!!!
dudu pererê- poeta e cientista social