Na falta de providência que não sejam agressões a quem apareça em seu caminho iluminado, o presidente Jair Bolsonaro volta ao passado que lhe é mais caro e saudoso, a ditadura militar. A ideia de “comemorar” o 31 de Março, aniversário da “redentora”, nem é original, pois durante os 21 anos que durou, ela foi lembrada em todo aniversário nos quartéis, pelo menos com a leitura da Ordem do Dia escrita em Brasília alusiva à data. Não havia festa nas ruas, como tampouco há no 7 de Setembro, pela simples razão de que ao povo só é permitido festejar o carnaval e conquista da Copa do Mundo. Aí está também a raiz de o povo não saber, hoje, que vivemos por 21 anos uma ditadura violenta como as de sua época na América do Sul. Por isto, também, Bolsonaro diz que não houve ditadura, apenas “uns probleminhas” comuns à vida de marido e mulher. E seu pseudo-chanceler segue o tom e nega igualmente a ditadura, mas não se deve levar a sério porque ontem mesmo elogiava a Dilma como mulher de coragem e descortino político. O coro da negação se espalha pelo governo e ganha espaço na mídia não pelo inusitado, mas sim pela maneira como é repetido no mundo civil. No meio militar sabe-se, desde 1964, que a “revolução” veio para livrar da ameaça comunista que rondava João Goulart, trabalhista avesso a totalitarismos, em especial o comunismo cuja expressão máxima àquele tempo era a União Soviética. Desde então, militares das três armas são doutrinados contra qualquer ideia de esquerda, fiéis à doutrina americana vigente na América inteira desde o fim da segunda guerra mundial, com a pequena e honrosa exceção de Cuba e, agora, da Venezuela, que não é ameaça comunista mas detém a maior quantidade de petróleo do planeta.
Por trás da decisão de Bolsonaro de festejar a data de triste memória para a nação está mais um factóide de seu governo. Foi a maneira rápida de desviar a atenção da sua briga com Rodrigo Maia, de Sergio Moro com Rodrigo Maia, de Paulo Guedes com Rodrigo Maia e por aí vai, parece que todo mundo tem uma diferença qualquer com o presidente da Câmara que tem mesmo cara de poucos amigos e quando ri é mais um esgar nervoso do que expressão de alegria. O xis da questão é que Maia, ao contrário dos contendores, é político profissional, filho de César Maia, egresso da primeira turma do brizolismo no Palácio Guanabara. Rodrigo, como o pai, começou a vida no PDT carioca, mas debandou para o mundo liberal, encantado pelas sereias e pelos cifrões. Hoje é político forte, cevado na farta mesa do poder, trata Bolsonaro e acólitos da única forma que conhecem: na porrada, sejam ministros, deputados, o próprio presidente. Não mexem com ele os militares do governo e o ministro que tem nome de chuveiro e que, em Santiago, falou em banho de sangue de Pinochet para limpar o Chile. Outra cavalgadura.
A “comemoração” do advento da ditadura vem espezinhar a sociedade civil e encher ainda mais a bola dos militares, a quem Bolsonaro espera recorrer caso seus impasses político-administrativos se tornem mais volumosos e intransponíveis, o que se adivinha no horizonte devido, sobretudo, à incompetência já proverbial do presidente Tudo leva a crer que o domingo será de fato festivo nos quartéis, a despeito das determinações em contrário, e isso não tem maior importância, é apenas simbólico destes novos velhos tempos de retrocessos tantos que é difícil ao cronista tratar de um assunto, porque à medida que vai escrevendo os fatos acontecem a tal velocidade e imprevisibilidade que quase sempre não é possível seguir. Mas a gente tenta…