Segundo o Depen ( Departamento Penitenciário Nacional ), em 2020, o grupo de pessoas LGBTQIA+ preso, era formado por 10.161 pessoas – entre elas, 1.027 travestis, 611 mulheres trans e 353 homens trans.
De acordo com a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT, que tem por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental decorrente da Constituição, resultante de qualquer ato (ou omissão) do Poder Público, as travestis e transexuais podem escolher para qual sistema prisional (masculina ou feminina) serão enviadas a fim de cumprir suas penas.
Em um contexto social marcado pela invisibilidade e preconceito, onde o que realmente importa é o cumprimento da pena/Lei, a ausência de políticas públicas para essa realidade de centenas de “Joãos e Marias”, seres abstratos, vivenciada no país há décadas e que traz nessas linhas o reverberar ou o denunciar a realidade prisional pela qual passa centenas de travestis e transexuais na terceira idade (terceira idade é a fase da vida que começa aos 60 anos nos países em desenvolvimento e aos 65 anos nos países desenvolvidos de acordo com a Organização Mundial de Saúde – OMS).
Verifica-se, entretanto, que por vezes a preocupação com os idosos travestis e transexuais se detém na prevenção das doenças como tuberculose ou na administração de vacinas em campanhas periódicas realizadas por parte do governo federal, mas o que usualmente os acometem, é algo superior, terrível em detrimento da qualidade plena da vida, a qual só pode ser alcançada por meio do conhecimento acerca das reais necessidades que os idosos gays apresentam. Acredita-se que um caminho para compreender tais idiossincrasias é buscar apreender o significado do envelhecimento para esses indivíduos.
Dessa forma, Travestis e transexuais idosos no sistema prisional precisam serem (re)vistos sob a ideia de que a prisão enquanto um ambiente insalubre, sobretudo pela existência de condições agravantes inerentes ao encarceramento, tais como: desvalorização social,
diminuição no convívio familiar, dificuldade no exercício de atividade laboral, conflitos que permeiam a convivência intergeracional, necessitam sim de “leis e políticas sociais” – como ADPF 527 da ABGLT, da luta em defesa dos direitos pela CNCD/LGBT – Conselho Nacional de Combate à Discriminação de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais.
Mediante ao exposto, propomo-nos discutir a relevância da ADPF 527 a partir da motivação do grupo LGBT diante do Supremo Tribunal Federal – STF, defenderem e representarem com extremo esforço a voz das travestis e ou transexuais encarceradas, levantando os seguintes aspectos, primeiro os desafios e resistências que as travestis, assim como os transexuais trazem em relação aos debates de gênero, o direito de cumprirem suas penas em presídio compatível com sua condição, já garantidos em respeito aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III), da proibição ao tratamento degradante ou desumano (artigo 5º, inciso III) e da garantia à saúde (artigo 196), na Constituição Federal 1988.
A época contemporânea reflete-se numa imagem: O tema da travestilidade e envelhecimento, como apontado, é ainda pouco explorado em pesquisa, sendo um tema marginal também nas ciências humanas. Para o desenvolvimento de pesquisas na travestilidade, transexualidade e envelhecimento, é fundamental considerar categorias sociais em intersecção e o entendimento dessas como socialmente construídas.
Falar de respeito, saúde ou humanismo devem ser o cenário de origem nessa nossa reflexão, assim, uma referência substantiva para o reconhecimento de que esses seres humanos possam enquanto sujeitos históricos, superarem a marginalização que insiste em si eternizar em meio a essa categoria, onde esperamos até mesmo a superação de conceitos pejorativos disseminados por parte da sociedade estigmatizadora que afirmam por vezes o jargão/ditado que se tornou popular no Brasil de que a “maioria das travestis são marginais a vida inteira e quando envelhecem elas viram velhas marginais”.
Assim, até quando conviveremos com essa realidade de descaso para com essa parcela da população brasileira? De que travestis e transexuais envelhecidos nos presídios são sujeitos de direitos? Será um erro imaginar que a mudança da atual condição de nossas “idosas” virá de uma ação isolada – a ADPF 527?
É fundamental que nos articulemos enquanto cidadãos e busquemos estratégias, que assegure a universalização do Direito e o acesso a justiça, apoiada a uma nova ordem democrática, cuja expressão maior é a participação cidadã do conjunto de seus autores sociais.
Somente a partir de uma articulação dessa natureza, num processo de radicalização da democracia, decorrerão ações planejadas e intencionalmente dirigidas à transformação da sociedade travesti e ou transexual nas prisões brasileiras.