Quem tem 60 anos ou mais, integra o grupo de risco etário do contágio na atual pandemia e tem memória e algum conhecimento da história recente do país deve lembrar-se dos “anos de chumbo” da ditadura militar de 1964/85. Tempo de obscurantismo e censura, ausência de debates e imposição das verdades oficiais. Embora a roda da história não retroceda senão como farsa, os tempos sombrios do militarismo estão de volta, a começar pelo Ministério da Saúde, que sofreu firme intervenção militar e tem hoje cerca de 30 fardados em postos importantes para o combate ao novo coronavírus.
Abaixo, segue a cartilha enviada aos servidores do ministério com instruções e ameaças, veladas umas, escancaradas outras, a todos. É o “Grande Irmão” de George Orwell vigilante e zeloso para que ninguém pense com independência e liberdade, mas antes pregue a verdade única, a grande fake news do Ministério da Verdade que só espalha mentiras, do Ministério do Amor que fomenta o ódio. Leiam com olhos preparados para o pior o texto reproduzido pelo jornalista Vicente Nunes em seu blog no Correio Braziliense desta terça-feira, 16:
“Ministério da Saúde encaminhou a todos os servidores da pasta um e-mail com “Dicas de ética” que devem ser seguidas nas redes sociais. Em um dos pontos, o ministério deixa claro que passará a monitorar tudo o que é publicado”.
“Quem vê seu perfil ou posts nas redes sociais, seja no WhatsApp, Facebook, Twitter e outras, está vendo também os comentários, fotos e informações de um agente público. As redes sociais são ferramentas muito úteis e práticas, mas devem ser usadas com cuidado”
Em outro ponto, a mensagem diz que a ascensão profissional pode ser definida de acordo com o que se divulga nas redes socais: “A função pública se integra na vida particular de cada servidor público e, por isso, os fatos verificados na conduta do dia a dia em sua vida privada poderão acrescer ou diminuir o seu bom conceito na vida funcional”.
Mais: “A dignidade, o decoro, o zelo, a eficácia e a consciência dos princípios morais são primados maiores que devem nortear o servidor público, seja no exercício do cargo ou função, ou fora dele”.
A cartilha foi definida pela Comissão de Ética do Ministério da Saúde, que apenas cumpre ordens. Hoje, a pasta tem quase 30 militares em cargos estratégicos.
Segundo servidores, o clima de perseguição no ministério é pesado, atrapalhando o trabalho técnico, o que tem dificultado o combate à pandemia do novo coronavírus. Eles ressaltam que a decisão de esconder números sobre infectados e mortos pela covid-19 pegou todo mundo de surpresa.
Os servidores também reclamam da censura sobre dados de saúde da atenção à mulher. Dois funcionários do ministério foram afastados por tratarem do casos de aborto previstos em lei, que, necessariamente, deveriam constar no documento da pasta sobre o tema. Não é só: informações sobre a saúde de negros foram tiradas do ar.
