O tratamento hormonal com testosterona para pessoas transmasculinas está muito difícil e, em muitos casos, impossível, desde que, em agosto do ano passado, houve um aumento de mais de 300% no preço do Deposteron.
Trata-se de um composto injetável, produzido pela farmacêutica EMS, usado por homens trans e pessoas não binárias que usam a testosterona como procedimento de afirmação de gênero.
E não só essas pessoas: quem é acometido por hipogonadismo, problema na produção natural de hormônios, entre outras indicações, também está pagando caro, quando pode pagar, pelo tratamento.
A marca da EMS é a mais utilizada, indicada pelos médicos por costumar ser mais segura e gerar menos efeitos colaterais.
Preço exorbitante
A comunidade trans denuncia que, mesmo com o reajuste previsto pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), o aumento seria em torno de 10%.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse aumento chegou a 17% em alguns estados brasileiros. O caso da Deposteron é um ponto fora da curva e não há previsão de volta ao valor comum.
Problemas de saúde
A interrupção no processo de hormonização pode gerar a volta da menstruação e da voz. Isso gera desconforto com características corporais, que trazem grande sofrimento. Quando alguém está há muitos anos realizando tratamento, podem acontecer crises de abstinência e efeitos colaterais graves, pois é um procedimento para toda a vida.
Depois de alguns anos usando testosterona, o corpo parar de produzir naturalmente hormônios essenciais.
Kyan Eric, 19 anos, morador de cidade satélite periférica do Distrito Federal, pessoa indígena tarairiú, autista, se identifica enquanto transmasculino.
Ele articulou uma vaquinha para arcar com os valores e continuar com a transição hormonal. “A questão que mais me atravessa atualmente é a da saúde, me tirando acesso a manter a sanidade mental estável por crises de disforia”.
Acompanhamento médico
A população trans sofre também com a falta de acompanhamento médico para a realização da hormonização devido à falta de ambulatórios trans em muitos territórios ou pelo número limitado de vagas oferecidas.
Kyran diz que, devido à longa fila de espera do ambulatório de sua região, muitos, assim como ele, estão recorrendo a terapia hormonal sem acompanhamento profissional. Além do uso irregular, muitas vezes não há dinheiro para comprar hormônio nas datas certas de aplicação.
Rio de Janeiro
Gabriel Souza, 29 anos, autônomo, é um homem trans morador do Complexo do Alemão, favela da zona Norte do Rio de Janeiro. Ele relata a dificuldade para manter o processo de hormonização.
“Com o aumento gigante do preço dos hormônios, tenho tido dificuldade de ter acesso, é delicado dar continuidade ao tratamento. Tem uns três meses que estou sem hormônio e isso me deixa frustrado, vendo meu processo parado, algumas coisas regredindo.”
Gabriel relata que conhece pessoas que passaram a comprar a testosterona por meios ilegais, algo que pode ser perigoso e trazer consequências para a saúde.
“Tem meninos tendo muitas crises de ansiedade e optando por comprar os hormônios de outros lugares, por desespero. Já era difícil pra muitos comprar, quando ele custava 50 reais. Agora, com um valor que chega a 250 reais, é muito difícil arcar com o custo.”
Ele finaliza com um desejo. “Espero que dias melhores cheguem e que tanto eu quanto os outros meninos possam dar continuidade ao tratamento, que sejamos assistidos com dignidade. Porque isso é questão de saúde pública”.
Luta pela diminuição do preço
A deputada estadual Luciana Genro (PSOL-RS) está acompanhando a situação. Entre outras ações, juntamente com a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL), enviou ofício à ministra da Saúde, Nísia Trindade, solicitando medidas para a inclusão do Deposteron na lista de remédios do SUS.
A Associação Nacional de Travestis e Mulheres Transexuais (ANTRA) encaminhou ofício ao ministério de Saúde, que trata de demandas da população trans. Entre elas, o aumento do medicamento Deposteron.
No Rio de Janeiro, pessoas trans estão pedindo judicialmente, de forma individual, o custeamento do remédio, através do Núcleo de Defesa Dos Direitos Homoafetivos e Diversidade Sexual (NUDIVERSIS), órgão da Defensoria Pública.
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