Quem viaja em algum transporte público no Rio de Janeiro com certeza pensará que a pandemia é coisa do passado, ou que não passou mesmo de uma “gripezinha” derrotada pelo histórico de atleta do carioca, que “pula em esgoto e não acontece nada”, como declarou o presidente da república em menosprezo à pandemia e à população, ao mesmo tempo. Mas Bolsonaro não está só nesta posição, muitos governadores, prefeitos e até profissionais de saúde defendem a retomada da economia sem receio e o uso de cloroquina se tossir, espirrar ou sentir febre.
Ônibus, metrô, barcas e trens estão lotados como no “velho normal”. Passageiros ignoram o distanciamento social, disputam espaço em vagões e, em alguns casos, ignoram até a máscara obrigatória. Num cenário ainda de propagação do novo coronavírus (nesta quarta-feira, a cidade maravilhosa passou de 10 mil mortos pela doença), a superlotação preocupa especialistas.
Segundo as concessionárias de transporte público, o número de usuários cresceu cerca de 30% em relação ao início do isolamento social. Todas dizem adotar medidas de precaução, as chamadas “regras de ouro”, mas a prefeitura aplicou 3.120 multas a ônibus por desrespeito ao número máximo de passageiros em pé permitido — 12, no caso de linhas comuns e de 24 a 30, dependendo do modelo do veículo do BRT. Nos outros modais, a situação não é muito diferente, na percepção de quem depende deles para fazer o trajeto casa-trabalho diariamente. É o que conta a caixa de supermercado Íris Cruz, moradora da Fazenda Botafogo, na Zona Norte. Para chegar de metrô até o emprego, na Zona Sul, diz, é um suplício.
“Distanciamento aqui não existe. No início, era melhor porque os guardas do metrô controlavam, entravam no vagão, mas agora eles não fazem mais isso. Tem gente que só fica de máscara para passar na frente do fiscal que fica na catraca, mas depois tira no vagão e não há controle. As pessoas acham que já está tudo bem, mas não está”, preocupa-se.
Numa viagem ao acaso, além da superlotação, chama a atenção a ausência de lembretes aos usuários sobre as determinações de distanciamento social. Tampouco há fiscalização do uso da máscara. Passageiros disseram que o “novo normal”, para eles, ainda não chegou; no entanto, estão acostumados ao empurra-empurra dos veículos superlotados desde muito antes da pandemia.