No telejornal, enquanto o repórter transmite da rua novaiorquina manifestação em defesa do clima e do ambiente, a jovem negra se posiciona atrás dele, olhos fixos na câmera e um meio sorriso de quem sabe o que faz. Sua figura esguia, seu porte nobre e seu cabelo natural alcançam uma multidão de telespectadores pelo mundo. Ela não sabe onde aquelas imagens vão nem com que olhos a veem, mas sua presença está neste instante em self-services, apartamentos, botequins, casas, shoppings, quartos de hospitais, portarias de prédios, antessalas de médicos, dentistas, advogados. Aquela jovem habitante de Nova York exibe um singelo cartaz de apelo pela vida no planeta e por segundos fugidios seu olhar encontra o meu, o seu, o nosso em um apelo silente pelo futuro da sua geração, pela preservação do planeta.
Seu recado é direto: “Mudem o sistema, não o clima”. Em outras palavras, pede que o mundo abandone o capitalismo para interromper a corrida do dinheiro contra a vida, do lucro sobre a pobreza, e abrace a boa e velha fraternidade, mas abrace com sinceridade de propósitos e ações positivas. Neste mundo onde o mal, a iniquidade e a injustiça imperam esta é a saída possível, a tábua de salvação, a solução proverbial. Digo isto porque tenho me debruçado nos últimos dias sobre os conselhos e as observações de Salomão nos livros de Provérbios e Eclesiastes, escritos há três mil anos, mas de inquietante atualidade.
Como no palco de teatro, lá desfilam todos os personagens dos nossos dias, políticos, religiosos, juízes, hipócritas, ladrões, usurpadores, opressores de todas as cores e formatos. Salomão adverte, já no início do Eclesiastes: “O que aconteceu antes vai acontecer outra vez. O que foi feito antes será feito novamente. Não há nada de novo neste mundo. Será que existe alguma coisa de que a gente possa dizer: “Veja! Isto nunca aconteceu no mundo”? Não! Tudo já aconteceu antes, bem antes de nós nascermos.”
Tenho estudado os ensinamentos de Salomão nos chamados livros sapienciais porque a Bíblia anda muito na moda e na língua de muitas autoridades, mas uma moda enganosa e em interpretações equivocadas que tentam misturar costumes com ciência sempre com o propósito de impor os primeiros sobre a segunda, afirmar Deus sobre todos ou tudo e negar as verdades científicas comprovadas, documentadas, estatísticas. É o elogio à ignorância, a vitória da Idade das Trevas marcada por Petrarca na Alta Idade Média, que perdurou até depois do século XVI e que aí está novamente para confirmar as sábias palavras de Salomão.
No seu jeitão jeca, com poucas luzes e ainda menos letras, o chefe do governo comete desatinos e destemperos verbais que mostram claramente sua incompreensão do país no concerto das nações. Xinga, ofende, humilha a torto e a direito, elogia quem não deveria sequer mencionar, cerca-se de puxa-sacos profissionais, gente desqualificada, anda em companhias que não resistiriam a um baculejo de polícia séria, ri da desgraça e da miséria de seu povo, vinga-se nos indefesos, teme a própria sombra, vítima da síndrome da facada fake. É a caricatura do vilão cheio de si e louco, sem juízo e sem noção da sua função no mundo. Ele não é uma andorinha solitária, faz parte de um bando em ascensão em várias partes, por inspiração e sustentação dos Estados Unidos.
Bom mesmo, diante disso tudo, é beber da sabedoria salomônica, a parte do Antigo Testamento ignorada pelos evangélicos do governo. E aguardar o fim das trevas.