Uma escola para servir de modelo

O Rio de Janeiro é o palco do belo projeto sociocultural Ocupa Escola, que visa complementar a educação de crianças e adolescentes através da arte e a cultura. A ação atende a mais de 20 escolas da rede municipal de ensino que estão localizadas nas zonas norte e oeste. Pessoalmente, faço esse trabalho em duas escolas de Vila Isabel que recebem principalmente crianças e jovens de comunidades do entorno, como Mangueira, Encontro e Macacos.

Hoje, quero falar de uma escola em especial: a Jornalista Assis Chateaubriand, que fica na entrada de um dos acessos ao Morro dos Macacos. A escola tem uma direção que sabe da importância da cultura enquanto ferramenta transformadora na vida das pessoas. Todo mês, ela reserva um dia especial para enaltecer a cultura do Brasil e de outros lugares. Na sexta-feira passada, a escola preparou uma festa em homenagem ao Dia da Consciência Negra.

O evento começou com uma mesa formada por mim, um professor da escola e uma ex-merendeira da região que alfabetizou várias crianças dos morros de Vila Isabel, além do grande historiador e vencedor do Prêmio Jabuti Luiz Antônio Simas.  A quadra de esportes estava lotada de alunos que, no começo, resistiram e ficaram meio dispersos, mas quando o professor Simas passou a contar a história e a fundação do Morros do Macacos, conseguiu conquistar a platéia (aliás, conversar ou assistir o Simas falar da história da nossa cidade é muito cativante e um privilégio enorme!). Ao final da explanação, o professor respondeu a algumas perguntas dos alunos e, no final, o samba enredo da Vila Isabel “Valeu Zumbi” foi executado em homenagem ao Luiz Antônio Simas, que já disse em diversas ocasiões que este é o seu samba favorito.

Pausa para o almoço: como era uma festa em homenagem à cultura africana, o cardápio não podia ser outro que não uma feijoada com carne seca.  A Secretaria Municipal de Educação não permite o consumo de carne suína nas escolas, mas as merendeiras da Assis são espetaculares e fizeram mais um almoço incrível!

De volta à quadra, fomos recebidos pela bateria da Escola de Samba Mirim Herdeiros da Vila, que botou muita gente para cair no samba. Prosseguimos com a programação com uma oficina de turbantes e maquiagem afro, e foi sensacional ver principalmente as alunas adolescentes se orgulharem de estarem se embelezando na frente de todos. Para tentar atrair os meninos para participar da festa, fui o primeiro a vestir um turbante. Nas comunidades, assim como em qualquer outro local, o machismo e a homofobia é algo que as crianças absorvem muito cedo. E quando o meu ficou pronto, alguns moleques tentaram me zoar, mas como viram que não me incomodei, pararam e fiquei feliz de ver que depois uns três se renderam e foram colocar seus turbantes também. Ponto para Vall Neves, do Coletivo Balalakina, que também atua em várias favelas com a festa Black Santa! Depois de muita arrumação e maquiagem, as meninas brilharam num desfile afro, e tenho certeza que todas se sentiram rainhas!

Finalmente, chegou a parte musical do dia e, para animar, o recém nomeado comendador DJ Saddam foi lá dar sua contribuição, tocou as pedradas dos bailes funks, Hip Hop e Soul e mandou seu recado para a garotada. A rapper e ativista Negra Rê também mandou suas rimas, nas quais fala de racismo e machismo convocando as pessoas a terem visão crítica e não deixarem de lutar contra todas as opressões que o povo favelado (e, principalmente, negro) sofre na sociedade. Mais uma negra guerreira e favelada!

Quero parabenizar toda a direção da Escola Municipal Assis Chateaubriand, que trata seus alunos com dignidade, respeito e amor incondicional – principalmente, a diretora Fernanda Alves, que luta diariamente contra a violência do Estado, que coloca policiais armados de fuzis na porta da escola para intimidar moradores e alunos.

 

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Créditos: Julio Barroso / ANF