Uma estética para renovar o mito

A crise na Policia Militar no Estado do Rio de Janeiro é uma constante preocupação da população e dos governantes fluminenses. Os principais projetos aplicados nos últimos governos foram de potencialização do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e a
Unidade de Policia Pacificadora (UPP).

Após a desastrosa ação em 12 de junho de 2000 durante o caso do Sequestro do Ônibus 174, que terminou com a morte da refém e o assassinato por asfixia do assaltante dentro de uma de suas viaturas, o Bope teve sua imagem supervalorizada pelo filme campeão de bilheteria “Tropa de Elite”, que colocou a equipe como uma organização incorruptível e eficiente para combater a criminalidade.

 

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Créditos: Reprodução internet

 

Os “caveiras” do Bope não usam algemas, não foram treinados para prender ninguém. São chamados para resolverem situações que ultrapassaram o limite estratégico da Polícia Militar de patrulhamento e a repressão de rotina dos batalhões de áreas. O Bope é uma tropa de elite preparada para matar, apoiada por um carro-blindado que, além de disparar tiros, ainda emite sons com frases de efeito do tipo: “Vim buscar sua alma”.

Hoje, o Bope faz parte do cartão postal do Rio de Janeiro. É comum ver pessoas pedirem para tirar fotos com os homens de preto que trazem nos uniformes o tétrico símbolo de uma caveira com punhal transpassado e duas garruchas, que são um dos diferenciais estéticos que os caracterizam e os destacam das outras equipes da Polícia Militar. Isso significa que toda a má impressão gerada pelos anos de desgaste diante da sociedade deixaria de existir, criando uma sensação de segurança baseada no desenvolvimento de uma nova marca de segurança pública. Isso só não aconteceu de fato como aumento dos casos de corrupção relacionados a oficiais da dita Tropa de Elite, fazendo cair assim a máscara dos “caveiras”.
UPP: e agora?

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Créditos: Reprodução internet

 

A criação das Unidades de Polícia Pacificadora norteou os últimos governos no Estado do Rio de Janeiro. Os governantes basearam a política de segurança pública neste projeto de ocupação dos territórios abandonados pelo poder público e tomados por grupos paramilitares.

Os policiais das UPPs são uniformizados com uma roupagem mais leve, com um tom de azul mais claro que os tradicionais azul-marinho das fardas da PM. Muitos são recém formados. Mas o perfil militar e o caráter repressivo da força policial causou um mau estar-social nas favelas ocupadas, gerando inúmeros conflitos entre moradores e policiais por conta de truculência e abuso de autoridade até mesmo de agentes femininas, que já foram acusadas por moradores de espancar meninas que teriam envolvimento com o tráfico de drogas.

Por outro lado, os traficantes ainda armam emboscadas nas vielas, alvejando policiais à queima-roupa, atacam os contêineres usados como base pelos militares, entre outras ações típicas de guerrilhas urbanas, e acabam por desestabilizar o programa de ocupação ao denunciar indiretamente sua falência de estratégica militar para lidar com a situação.

A ocupação militar das UPPs não foi acompanhada pela ocupação de cidadania, saúde, emprego, educação, esporte, arte e lazer. O projeto UPP foi apenas de abafamento do tráfico ostensivo nas favelas que, por sua vez, a cada dia ganha mais fôlego e novos territórios. Voltaram os conflitos entre as quadrilhas pela conquista de pontos de venda de drogas em comunidades já ocupadas pela força policial.

No dia 11 de outubro 2016, o Secretário José Mariano Beltrame, um dos principais articuladores do programa das UPPs, pediu demissão do cargo, iniciando oficialmente o processo de desmonte das Unidades de Policia Pacificadora e o fim do projeto de ocupação, que lentamente se dissolve no banho de sangue das comunidades cariocas.

 

Segurança Presente para quem?

Uma nova solução chegou às ruas em 01 dezembro de 2015: a Operação Segurança Presente. A Operação oferece presença ostensiva de agentes de segurança em quatro importantes áreas da cidade do Rio de Janeiro: Centro, Lagoa Rodrigo de Freitas, Aterro do Flamengo e Méier. O projeto mobiliza mais de 400 agentes e é financiada pela Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio), o que representa à iniciativa privada o custo de R$22 milhões por ano.

 

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Créditos: Reprodução internet

 

Cada operação tem um nome específico: Operação Centro Presente, Lagoa Presente, Aterro Presente e Méier Presente.

Da equipe do Lapa Presente, por exemplo, fazem parte 135 agentes, sendo 76 policiais militares e 59 agentes civis, que praticamente servem como figurantes para aumentar o contingente na rua. Eles são caracterizados pelos seus uniformes, em geral, nas cores cinza, amarelo, vermelho, laranja e verde com faixas refletivas de acordo com a região onde atuam.

As equipes fazem patrulhamento em carros, motos de bicicletas e também a pé. Suas ações são filmadas e provas são produzidas na hora da abordagem. O programa conta com agentes femininos e são conhecidos por sua intolerância para delitos como o porte de pequenas quantidades de drogas.

Além dos veículos citados acima, ainda contam com o apoio das vans. Segundo freguentadores da Lapa que já foram detidos, o automóvel serve como uma espécie de “carrocinha de cachorro vira-latas”, onde quem não está em conformidade com a lei é levado.

 

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Em 1° de junho de 2016, a Operação Segurança Presente ultrapassou a marca de 100 capturas de foragidos da Justiça e mais de 1,4 mil prisões realizadas. Funciona como uma polícia privada ou milícia institucional a serviço do comércio e o bem-estar do consumidor, ajudando a melhorar a imagem da cidade, impulsionando a retomada econômica e a fé na segurança pública.

O projeto é pontual em lugares de grandes aglomerações, principalmente em regiões com potencial turístico e comercial, deixando todo o resto do Rio com a polícia tradicional e suas mazelas. O caráter publicitário nas soluções encontradas pelo governo e iniciativa privada não pretendem reformar ou acabar com a instituição da Policia Militar, mas apenas criar novas equipes salvadoras da sociedade, que se diferenciam pelo uniforme e tentam, ao mesmo tempo se afirmar como polícia e também desconstruir a imagem falida da própria corporação perante a sociedade. É como se, recriando a estética, fosse possível renovar o mito.